MIÉ 24 DE ABRIL DE 2024 - 05:27hs.
Luiz Carlos Prestes Filho

“A democracia brasileira vai ser a maior beneficiada com a legalização do jogo”

(Exclusivo GMB) – Ao apresentar seu novo livro 'A Teoria das Probabilidades no Jogo, na Ciência e nas Políticas Públicas', Luiz Carlos Prestes Filho falou com GMB sobre sua fervorosa defesa da legalização da atividade no Brasil. 'O livro ajuda a entender que temos de anular os efeitos das leis criadas em governos ditatoriais', disse o autor.

Prestes Filho é especialista em Economia da Cultura e foi coordenador científico das pesquisas sobre as Cadeias Produtivas da Economia da Musica e Economia do Carnaval. Em seu primeiro livro, sobre os 30 anos do Sambódromo, ofereceu a palavra para aqueles que souberam transformar o carnaval carioca no Maior Mega Evento Cultural do Mundo: Anísio Abraão David, Ailton Guimarães Jorge, Luiz Pacheco Drummond e Carlinhos Maracanã.

GMB - Que razões o levaram a escrever um livro defendendo o jogo e associando-o à ciência e às políticas públicas na teoria das probabilidades?
Luiz Carlos Prestes Filho
- A discussão sobre a regulamentação de Jogos de apostas em dinheiro administrados pela iniciativa privada no Brasil diz respeito à manutenção do atual regime democrático de direito. Temos de fazer valer a Constituição de 1988 e desta maneira anular os efeitos da Constituição da Ditadura do Estado Novo, de Getúlio Vargas (1937/1945), e da Constituição da Ditadura Militar de 1967, promulgada após o Golpe de 1964. Especificamente a lei das Contravenções Penais, que é de 1941, e o Decreto Lei 204/1967. Estes dois instrumentos legais estão em vigor e são citados nos relatórios relacionados com o Projeto de Lei 186/2014 do senador Ciro Nogueira. Meu livro veio para evidenciar que chegou a hora de anular o efeito desse entulho autoritário. As leis que proibiram as atividades de cassinos, bingos e jogo do bicho foram criadas em períodos quando torturavam, assassinavam e desapareciam com patriotas. Não podemos permitir que elas continuem vigorando. No Decreto Lei 204/1967 está escrito que é “dever do Estado, para salvaguarda da integridade da vida social, impedir o surgimento e proliferação de jogos proibidos que são suscetíveis de atingir a segurança nacional”. A democracia é um sistema político que está acima das ideologias e das religiões. Não podemos aceitar esta visão autoritária para com profissionais que trabalham com jogos e para com os jogadores. O livro ajuda a entender que devemos anular os efeitos de leis criadas em governos ditatoriais. Na minha opinião é leviano o Estado identificar num gerente de bingo, de cassino ou num banqueiro do jogo do bicho alguém que ameaça a segurança nacional.

Como conhecedor do setor de jogos, que contribuição você espera dar para a regulamentação da atividade com a publicação de seu novo livro?
Desejo que os leitores saibam que foi na mesa de uma taberna do século XVI, através de análises científicas de jogos de dados, que um dos maiores matemáticos da história, Girolamo Cardano, desenhou os princípios da Teoria das Probabilidades. Ele fazia apostas em dinheiro e fez uso da probabilística para ganhar. As teses apresentadas no seu livro “Líber de Ludo Álea”, orientaram grandes matemáticos, como Pascal e Fermat. Portanto, os jogos não trouxeram somente tragédias e doenças. Os modelos probabilísticos desenhados por Cardano servem ainda hoje como ferramenta de análise no campo amostral-estatístico de Big Data, por exemplo. No livro apresento o artigo do professor Aloisio Araújo, do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), que versa sobre temas que demonstram o quanto a probabilística hoje tem relação com Políticas Públicas. Por outro lado, o professor Jorge Ávila, ex-presidente do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), lembra que as atividades de jogos são fundamentais para movimentar centros de ciência, tecnologia e inovação. Um tema que não foi debatido durante todo o atual processo que busca a regulamentação de cassinos, bingos e jogo do bicho é o da “Propriedade Intelectual”. O advogado Frederico Lemos apresenta no livro uma reflexão importante quando pergunta: “O destino do Brasil na área de jogos será somente o de importar software e hardware? Será que os cassinos serão ilhas exclusivas de serviços e produtos importados?”

O livro demonstra que chegou a hora de trazer as melhores universidades brasileiras - públicas e privadas - para que elas se beneficiem dos resultados da regulamentação. Estas podem desempenhar um papel estruturante no setor igual às universidades americanas, inglesas, francesas, japonesas ou chinesas.

O livro contém capítulos próprios e outros assinados por articulistas. Como foi a escolha de temas e autores para abordar a questão da probabilidade e associá-la à ciência, às políticas públicas e à regulamentação do jogo?
Buscamos autores e personalidades com excelência de conhecimentos no setor. Mas lançamos um olhar para o horizonte. Entendemos que a palavra do ministro da Defesa, Raul Jungmann, que reconhece ser um “despautério” relacionar jogo com soberania nacional, é fundamental para o avanço do debate da regulamentação. Veja, em 2007, quando fecharam os bingos, muitos gerentes e proprietários dessas casas que funcionavam legalmente foram presos em presídios de segurança máxima. Isso porque o Estado considera que a atividade de jogos ameaça a segurança nacional! Neste contexto, a palavra do General do Exército Mauro Barroso, que lembra que o principal ideólogo da Doutrina de Segurança do Brasil, Golbery do Couto e Silva, tentou regulamentar o jogo do bicho, é algo interessantíssimo. Mas, associamos a luta pela regulamentação dos jogos à Teoria das Probabilidades, como afirmei acima, para mostrar que em 500 anos a atividade deu grande contribuição para o desenvolvimento da ciência, no geral, e da matemática, particularmente.

Um capítulo chama a atenção: “Jogos e Soberania Nacional”. Poderia resumir o conceito dessa associação?
O Senador José Serra, chegou a afirmar, em texto publicado no jornal “O Estado de S.Paulo” que o jogo regulamentado promoverá o “aumento do que é proibido” como, por exemplo, lavagem de dinheiro. Quando pedem para ele trazer fatos, ele não traz fatos. Até porque a visão deste senador é superficial e se baseia nos preceitos da Constituição de 1967. Estudiosos do tema afirmam que o sistema financeiro internacional, em meio à crise econômica, não tem liquidez. É exatamente esta estrutura que garante a realização do ilícito que o senador Serra joga para cima do jogo de apostas em dinheiro. Tanto que o chefe do Serviço Federal russo de Controle de Drogas (FSKN), ministro Victor Ivanov, reconhece abertamente que a lavagem de dinheiro é realizada com suporte de banqueiros e grandes corporações. Segundo este ministro russo, “a maior parte” dos recursos ilícitos retorna aos interessados, “inteiramente limpo pela lavagem promovida por grandes bancos internacionais”.

O ministro Ivanov aponta que o banco britânico HSBC e os norte-americanos Bank of America, Western Union e JP Morgan estão na lista das instituições financeiras que promovem lavagem de dinheiro. Vamos pedir então o fechamento destes bancos no Brasil ou vamos fiscalizar mais e mais essas instituições financeiras? Os cassinos e os bingos, condenados pelo ilustre senador da República, como agentes potencializadores de lavagem de dinheiro, não têm destaque nos relatórios russos. O jogo do bicho sequer é lembrado. Até porque esta modalidade não tem similar no mundo, está isolada dentro de nossas fronteiras.

O senador Serra faz discurso para plateia sobre suas suposições de que jogo é uma ameaça ao Estado. Então vamos trazer para o debate as suposições, apresentadas na mídia este ano, de que este mesmo senador, juntamente com o banqueiro Ronaldo Cezar Coelho, lavou dinheiro durante a campanha eleitoral de 2004? A Polícia Federal o indiciou por evasão fiscal. Pelo que eu li no jornal “Folha de S.Paulo”, o Serra não precisou de um cassino ou de um bingo para fazer transações ilícitas. Somente de bancos e empresas lícitas.

O Brasil vem debatendo há décadas a regulamentação do jogo e nunca sai do debate. Chegou o momento da aprovação de uma lei do jogo no Brasil?
A democracia venceu! Finalmente, depois de 100 anos da proclamação da República estamos vivendo o primeiro ciclo de governos eleitos pelo povo: Fernando Collor, FHC, Lula e Dilma. Temos de radicalizar em direção da democracia. A regulamentação dos jogos, na minha opinião, está inserida neste cenário.

Acredita nos benefícios sociais do jogo para a economia e o turismo?
Repito, a democracia vai ser a maior beneficiada. Com a regulamentação dos jogos de apostas em dinheiro vamos iniciar a faxina que nossos deputados e senadores não tiveram a coragem de realizar desde a Constituinte de 1988. Temos de anular os efeitos danosos das constituições de períodos autoritários. Claro que o turismo poderá atrair novos fluxos de visitantes. O Rio de Janeiro é uma cidade muito mais atrativa do que Las Vegas ou Macau. Do ponto de vista econômico o Estado vai ter seus benefícios. Estaremos tirando da ilegalidade milhões de apostadores e profissionais de jogos. A tributação destas atividades oferecerá nova fonte de receita. Mas não podemos exagerar, imaginar que as atividades de jogos resolverão a nossa crise econômica.

Como os atores políticos favoráveis ao jogo e os operadores deverão se posicionar para mostrar à sociedade esses benefícios?
Temos de entender que os atores políticos favoráveis à regulamentação de jogos de apostas em dinheiro administrados pela iniciativa privada sofrem dificuldades terríveis para desenvolver suas atividades. O Estado não deseja abrir mão de suas receitas bilionárias nas loterias. Cria todo o tipo de armadilhas e, muitas vezes, busca criminalizar os mesmos. Penso que temos de ser persistentes e técnicos, buscar sempre o aprofundamento do debate teórico. Não buscar o falso caminho da facilidade que, por exemplo, permitiu a exploração de bingos no início dos anos 2000. As atividades se baseavam numa insegurança jurídica incrível. Tanto que levou ao desastre de 2007. Bingos fechados, centenas de empresários presos e milhares de trabalhadores demitidos.

Não existe mágica. Temos de buscar segurança jurídica para brasileiros e estrangeiros investirem em cassinos, bingos e jogos do bicho legalmente. Aqui destaco a importância do texto de Ana Paula Gatti Vital, que demonstra que ao regulamentar a atividade, temos de anistiar todos os brasileiros que foram criminalizados por trabalharem com jogos.

O livro está disponível em todas as livrarias que trabalham com a Editora E-papers/Frutos (R$ 45,00) e no site da editora (R$ 36,00 para a versão impressa e R$ 18,00 para a versão digital). Os sites da editora são http://www.e-papers.com.br e http://www.editorafrutos.com.br
 

Fonte: Exclusivo GMB

 

Galería de fotos