Jogos de apostas são um tema polêmico para muitos. Por um lado, eles são uma boa fonte de renda para o Estado, proporcionando oportunidades de emprego necessárias, e podem ser um passatempo agradável para quem escolhe se divertir com eles. Mas, por outro lado, uma parcela da população sofre muito por causa de tendências ao jogo compulsivo. Vício em jogos de azar pode custar às pessoas suas economias, empregos, famílias e. em circunstâncias extremas, até mesmo suas vidas. Embora medidas de prevenção estejam disponíveis, não há uma solução global para o problema.
Jogo patológico: um guia para iniciantes
Assim como o diabo, problemas com jogo também são conhecidos de várias formas – vício em jogo, jogo patológico, jogo compulsivo, ludopatia, etc. A Associação Americana de Psiquiatria define o jogo patológico como a persistência e recorrência do comportamento de apostar em jogos de azar que leva a prejuízos em diversas áreas da vida. Na prática, isso significa que consideramos jogo como patológico quando um jogador desenvolve um desejo insaciável de continuar jogando, apesar dos efeitos danosos ou seu próprio desejo de parar.
Assim como ocorre no alcoolismo, o jogo patológico atua no cérebro dos viciados, ocasionando a liberação de neurotransmissores que dão sensação de prazer como dopamina, serotonina e noradrenalina, o que encoraja comportamentos repetitivos. Dessa forma, apesar de não consumir substâncias físicas como álcool ou nicotina, jogadores patológicos também sofrem com sintomas de abstinência quando tentam parar de jogar. No entanto, vale mencionar que abuso de substâncias – seja álcool, tabaco ou drogas ilícitas – e jogo patológico frequentemente ocorrem simultaneamente.
Jogo Patológico em mercados menos desenvolvidos
Segundo Matej Novota, enquanto algumas comunidades estão mais sujeitas a problemas com o jogo devido a seu contexto socioeconômico, o vício afeta todos os mercados regulados de maneira similar. Como mencionamos anteriormente, mesmo os mercados desenvolvidos sofrem esses efeitos, como evidenciado pela Austrália, que tem a maior comunidade de jogadores compulsivos do mundo.
No entanto, mercados mais jovens com legislações menos maduras tipicamente possuem menos meios para combater os impactos negativos do vício. Novota apresenta a questão com mais detalhes: “Mercados de aposta maduros têm uma grande variedade de regulações e ferramentas para ajudar a prevenir o jogo compulsivo ou tratar os que já foram acometidos. Infelizmente, para países entrando no universo da aposta, essas medidas responsáveis e sustentáveis requerem tempo e dinheiro para serem postas em prática, o que esses países nem sempre possuem.”
Mas como Novota faz questão de enfatizar, o fato de que oferecer proteção aos seus jogadores é difícil não quer dizer que seja impossível: “Uma preparação cuidadosa é fundamental. Qualquer regulador que busca dar o pontapé inicial em seu mercado de apostas deveria antes estudar como outros países lidaram com a tarefa e adotar o que melhor se adeque às suas comunidades e circunstâncias. Embora nenhuma primeira tentativa seja perfeita, os reguladores devem buscar ter uma base sólida para poder propor suas legislações no futuro.”
Prevenção do jogo patológico no Brasil
Segundo Neil Montgomery, que é brasileiro, jogo patológico é um problema muito conhecido no Brasil há um longo tempo. Quando o Presidente Dutra decretou a proibição dos jogos de azar e apostas em 1946, isso aparentemente se deu em grande parte por influência de sua esposa, fervorosa católica e pelo medo de vício que compartilhava com ela.
Por causa disso, como sabemos, o Brasil ainda aguarda a regulamentação, em nível federal, da modalidade lotérica de apostas esportivas de quota fixa. A SECAP (Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria), uma divisão do Ministério da Economia, anunciou seus planos para uma iniciativa legal no fim do ano passado, em dezembro. Desde então, a última minuta de decreto presidencial circulada pela SECAP previu um modelo de concessão para o licenciamento. Há rumores de que haverá permissão para até 100 operadores atuarem dentro do território nacional.
Montgomery acrescenta que a regulamentação da Lei Federal N° 13.756/2018 conterá disposições relativas ao jogo responsável. No entanto, além desses fatos conhecemos muito pouco sobre a futura regulamentação e sobre as medidas para promover jogo seguro que estarão incluídas nela.
De acordo com Matej Novota, o Brasil possui políticas de publicidade para operadores excepcionalmente bem reguladas, se as compararmos com as de países como o Reino Unido, Suécia e outros que ditam as tendências. A lei brasileira estabelece que nenhuma atividade de marketing pode conter conteúdo enganoso ou abusivo. Para além disso, elas não podem conter menores de idade ou ter grupos vulneráveis como alvo.
Neil Montgomery também reconhece as contribuições do CONAR (Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária) nesse sentido. Caso um anúncio viole a legislação em vigor, o conselho autorregulatório investiga o caso e decide qual ação tomar. O CONAR pode arquivar a denúncia, deixar o anúncio inalterado, solicitar alterações ou retirá-lo completamente do ar. Ele ainda faz questão de mencionar que empresas locais e estrangeiras (ou operadores nesse caso) com acesso ao mercado brasileiro devem observar as disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor, em vigor desde 1991.
Montgomery fornece um marco legal rígido que dá a consumidores e associações o direito de tomar medidas legais contra fornecedores que oferecem serviços ou produtos defeituosos. Nesse contexto, fornecedores devem garantir que que esses produtos não tragam impactos negativos à saúde ou segurança de seus usuários e devem fornecer informação clara, completa e correta para quem os usa, e sobre qualquer tipo de dano que possam causar.
O advogado vai além na discussão: "Tudo isso está ligado de maneira inerente ao jogo responsável. Também é importante mencionar que os tribunais começaram a reconhecer que infrações ao Código de Defesa do Consumidor cometidas por fornecedores localizados no exterior podem ser julgadas no Brasil. Essa aplicação extraterritorial das leis brasileiras pode ser válida também para casos de proteção de dados, especialmente após a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (também conhecida como a LGPD) ter entrado em vigor em 2020 e o fim do período de carência, que ocorreu recentemente em 1 de agosto de 2021”.
Apesar de tudo o que foi dito, ambos os especialistas concordam que o Brasil ainda não está bem equipado para lidar com jogo patológico. Não há requerimentos de limites para apostar ou mecanismos de autoexclusão impostos aos operadores. Ademais, fazer apostas esportivas online, embora a lei ainda não tenha sido regulamentada, é uma atividade legal.
Como se manter seguro ao jogar no Brasil
Então, na ausência de outras redes de segurança e medidas de prevenção ao jogo patológico, a atual comunidade de jogadores do Brasil tem que se proteger por si mesma. Por sorte, todos podem tomar medidas para se proteger do vício em jogo, seja jogando no exterior ou para planejar seus jogos com os provedores que estão para chegar. Segue uma curta lista com as dicas de Matej Novota para jogar de forma segura:
Além da lista, Novota oferece um aviso e conselho: “Algumas pessoas podem sentir que essas medidas não são necessárias, mas eu recomendo que mesmo as pessoas que não veem nenhum problema com seus hábitos sigam essas dicas. Vício em jogo destrói vidas e pode inclusive ser mortal. Assim, com finanças, família e carreira em jogo, eu acho que nenhum cuidado é excessivo.”
Matej Novota
Profissional com larga experiência na indústria da aposta. Possui um conhecimento abrangente do negócio e seus aspectos humanos, graças à sua experiência avaliando cassinos online e tratando reclamações de clientes de todas as partes do mundo. Atualmente, lidera as equipes de avaliação de cassinos e atendimento a reclamações do Cassino Guru.
Neil Montgomery
Sócio-fundador do escritório de advocacia brasileiro Montgomery & Associados, onde encabeça o departamento de Esportes da Mente, Jogos de Fortuna, Apostas Esportivas, Loterias e Sorteios.