No começo de junho, o gestor de futebol do Náutico-RR, Marcelo Pereira, abriu boletim de ocorrência contra o próprio time. Foi à delegacia após derrota de 10 a 2 para o Trem-AP, pela Série D. Ele pediu investigação sobre suspeita de venda do resultado.
Em maio deste ano, oito pessoas, entre jogadores, técnico e dirigentes do Crato, foram denunciadas no Tribunal de Justiça Desportiva do Ceará por suspeita de manipulação de resultados no estadual. O clube foi excluído da competição.
São apenas dois casos, recentes e conhecidos, do mesmo crime denunciado por Santos e Red Bull Bragantino na última segunda-feira: manipulação ou tentativa de manipulação de resultados no futebol brasileiro. A motivação é geralmente a mesma: a interferência nos jogos para obter ganhos com apostas esportivas.
Paulo Schmitt, ex-procurador do Superior Tribunal de Justiça Desportiva e atualmente trabalhando para a Federação Paulista de Futebol em casos de manipulação de resultados, acredita que pode estar ocorrendo um aumento na incidência de casos suspeitos.
“Vejo isso com muita preocupação. O Brasil parece estar no epicentro de aumento de casos no mundo”.
Existe uma legislação para coibir essa prática. Envolvidos podem ser punidos, tanto esportiva quanto criminalmente. O Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), no artigo 242, afirma que quem dá ou promete vantagem indevida para árbitro ou atleta com o objetivo de interferir no resultado de um jogo pode sofrer multa de R$ 100 a R$ 100 mil e ser banido do esporte. O mesmo cabendo para intermediários e membros da arbitragem que aceitarem a vantagem.
No Estatuto do Torcedor, artigo 41-D, fica estabelecido que o responsável por manipulação de resultado no esporte pode sofrer pena de dois a seis anos de reclusão, e ainda pagar multa.
Ainda assim, os casos se repetem. Em março desse ano, a denúncia foi no Campeonato Sul-Mato-Grossense. Um jogador do Coxim acusou o time de ter perdido propositalmente o último jogo da primeira fase para o então último colocado por 5 a 0, quando precisava de apenas uma vitória simples para seguir na competição.
A demora para os casos serem apurados na esfera criminal gera a sensação de impunidade. A punição esportiva também pode ser eficiente. Assim como a conscientização de atletas.
“A atuação cooperada (esportiva e criminal) é sempre a melhor alternativa, ainda que possam produzir resultados em prazos distintos pois nos tribunais desportivos temos respostas mais rápidas. O que não pode ocorrer é deixar de investigar, controlar, fiscalizar e punir; e sobretudo dentro de um programa de integridade desenvolver ações educacionais e estimular denúncias”, afirmou Schmitt.
Foi justamente a denúncia da jogadora do Red Bull Bragantino, que recusou a proposta para interferir no resultado da partida contra o Santos, que permitiu que uma nova suspeita de tentativa de manipulação de resultado viesse à tona.
Ela recusou a primeira proposta do funcionário santista e depois recebeu uma segunda investida, com oferta maior. O crime ainda teve a participação de um intermediário, do Red Bull, que fez a ponte entre a jogadora e o autor da proposta de suborno.
O caso foi levado à CBF. A entidade afirmou que “recebeu a denúncia nesta segunda-feira (20) e, como procedimento padrão em casos como este, encaminhará ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) para a apuração completa dos fatos narrados”.
Além disso, Santos e Red Bull Bragantino levaram o caso para o Ministério Público e para a polícia.
"Se a regulação [das apostas esportivas] não contemplar obrigatoriedade da implementação de projetos de integridade pelas entidades organizadoras das competições e clubes, além de monitoramento de partidas por empresas especializadas, estaremos vulneráveis a crimes previstos no estatuto do torcedor como manipulações em apostas, fraudes em resultados, e lavagem de dinheiro", assegurou Schmitt.
Fonte: GMB / O Globo