As empresas de apostas esportivas on-line se multiplicaram no Brasil, são cada vez mais populares e já não há praticamente time de futebol que não ostente o patrocínio de uma das “bets” em seus uniformes ou jogadores famosos que não tenham aparecido em pelo menos uma propaganda.
São sinais do tamanho de um mercado que, segundo especialistas, movimenta até R$ 150 bilhões no país por ano, mas opera praticamente 100% na informalidade, sem pagar impostos.
É nesse mercado que o governo mira para conseguir aumentar a arrecadação e cumprir a meta de zerar o déficit público no ano que vem, prevista no novo arcabouço fiscal. Após o anúncio do governo federal de que vai taxar o setor, os grandes atores desse mercado avaliaram, segundo O GLOBO apurou, como positiva a proposta de regulamentação federal.
Em relação à alíquota de tributação, entretanto, as empresas reivindicam que seja equivalente às praticadas em outros países que já cobram imposto sobre as apostas.
As companhias avaliam que um percentual muito alto pode inibir a atuação legal e estimular a ilegalidade. Com tributação elevada, dizem, a atividade também pode ficar inviável, em muitos casos, e a estimativa de arrecadação do governo não vai se concretizar.
“A regulamentação da atividade é extremamente bem-vinda. Mas o que deve ser avaliado é a expectativa de arrecadação do governo: os números divulgados como potenciais não são realistas e estão embasados em dados com pouco fundamento”, afirma Darwin Filho, CEO do Esportes da Sorte.
Na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que as estimativas de arrecadação com o novo tributo sobre apostas on-line foram revistas e subiram de R$ 6 bilhões para entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões.
A sugestão do setor é adotar modelos de tributação já estabelecidos, como o da Inglaterra, onde não há cobrança de Imposto de Renda sobre o ganho do apostador e há apenas taxação sobre o chamado “Gaming Gross Revenue” (GGR) ou “Receita Bruta de Jogos”, diferença entre o volume total de apostas e o valor dos prêmios pagos, de 15%.
Outorga de R$ 30 milhões
Além da tributação das apostas on-line, o governo anunciará outras medidas que podem gerar incremento anual superior a R$ 100 bilhões aos cofres federais, reduzindo o déficit de R$ 231 bilhões previsto para este ano, disse Haddad. As vendas de comércio eletrônico também devem passar a pagar imposto.
O ministro disse que já se reuniu com as empresas de apostas digital, que se mostraram favoráveis à regulamentação para combater a ilegalidade. Haddad afirmou que as novas regras serão instituídas por meio de medida provisória, que está em fase de conclusão e deve ser divulgada em breve.
O GLOBO apurou com pessoas envolvidas nas negociações que a alíquota sobre a receita bruta dos jogos deve ser mesmo de 15%, seguindo padrão internacional. Como os sites de apostas estão baseados no exterior, o governo deverá cobrar uma outorga, cujo valor dever ser de R$ 30 milhões por um período de cinco anos de atividade para que as companhias se instalem no país.
Está sendo discutida ainda a cobrança de Imposto de Renda sobre o ganho dos apostadores e qual percentual será cobrado.
Como as apostas esportivas no Brasil foram legalizadas como “modalidade lotérica denominada apostas de quota fixa”, a tributação poderia ser semelhante ao que já é feito com loterias: 30% de Imposto de Renda sobre o valor ganho nas apostas acima de R$ 2.640,00.
Abaixo desse valor, o apostador estaria isento. Segundo especialistas, cerca de 90% dos apostadores brasileiros jogam recreativamente e não pagariam Imposto de Renda porque os ganhos ficam abaixo desse valor.
Os números do setor são imprecisos por ser praticamente todo informal. A estimativa é que ele tenha crescido muito, desde 2018, quando foi legalizado por meio de um decreto assinado pelo então presidente Michel Temer (PMDB-SP), embora, cinco anos depois, as atividades ainda não tenham sido regularizadas.
As apostas digitais movimentem anualmente entre R$ 120 bilhões a R$ 150 bilhões ao ano.
Cultura cristalizada
Cerca de mil plataformas on-line atuam nesse segmento, todas com sedes no exterior, em países como Malta, Gibraltar, Suécia, Chipre, Antígua e Barbuda.
Atualmente, 39 dos 40 clubes das séries A e B são patrocinados por casas de apostas – a única exceção é o Cuiabá. Os clubes divulgaram, na semana passada, uma carta pedindo ao governo para participar das discussões sobre as novas regras para o setor, já que existe a possibilidade de que o patrocínio das empresas aos clubes de futebol seja vetado.
“O ambiente digital de apostas atropelou o andamento de projetos de lei que versam sobre cassinos e jogos no Congresso. Atualmente, qualquer cidadão acessa e aposta em sites sediados em outros países. É um setor sem regulamentação, já que não há mecanismo para evitar desvios de resultados, por exemplo”, diz o advogado Eduardo Carvalhaes, sócio de Direito Público do escritório Lefosse.
Para Carvalhaes, a taxação e regulamentação desse segmento trarão segurança jurídica, combate aos vícios e, claro, arrecadação. Ele diz que as regras vão legitimar as empresas sérias, e o brasileiro vai fazer as apostas com mais segurança também, já que hoje não podem usar meios legais conhecidos como Procon ou Justiça Comum no caso de terem os seus direitos desrespeitados.
“Hoje, o capital intelectual e a mão de obra estão em outros países. Com as empresas instaladas no Brasil, vamos ter geração e formalização de empregos e segurança jurídica”, diz Márcio Falcão, representante do site Casa de Apostas.
Vendido como investimento
Um ponto que as empresas também querem que esteja contemplado na MP do governo é que seja vetada a propaganda que alguns sites de apostas fazem se apresentando como ferramentas de investimento. No YouTube, há diversos vídeos de plataformas se vendendo com esse tipo de marketing.
“Se apresentar como ferramenta de investimento é equivocado e vai na direção contrária do que acontece no mundo. As apostas têm a conotação de entretenimento e diversão, não têm o objetivo de investimento, até porque há muitas variáveis que não estão no controle do apostador”, diz o CEO do galera.bet, Marcos Sabiá.
Fonte: O Globo