Muito se tem falado sobre o potencial do mercado brasileiro de apostas esportivas e, por conseguinte, sua capacidade de gerar recursos para os beneficiários e para o Tesouro Nacional – os números são os mais variados, no entanto carecem de fundamento metodológico ou, pelo menos, suas bases não são divulgadas. Sem falar que, muitas vezes, misturam valores oriundos de cassinos e caça níqueis, os quais não são legalizados no Brasil.
Neste sentido, nossa proposta é oferecer uma análise tomando-se por base o mercado europeu de apostas esportivas, comparando o Gross Gaming Revenue (ou GGR, o que equivale ao total de apostas menos o pagamento de prêmios) onde esta modalidade é regulamentada, com o Produto Interno Bruto (PIB) de cada país.
Um estudo de 2020 da EGBA (European Gaming and Betting Association), sobre o mercado online da Europa, permite-nos extrair que, na média, o somatório do GGR das empresas autorizadas corresponde a 0,061% do PIB.
Como forma de moderarmos o valor médio, verificamos, a partir de fontes primárias, como se comportavam mercados maduros, reconhecidamente bem regulados e fiscalizados, tais como Dinamarca, Espanha e Reino Unido, sendo este último a principal fonte de benchmarking global.
Como resultado, encontramos os valores de participação do GGR no PIB de 0,054% na Dinamarca e 0,059% no caso da Espanha, os quais nos permitem adotar a média europeia como referência, uma vez que abarcam uma quantidade maior de realidades econômicas e sociais. Note-se que no caso espanhol, os dados da DGOJ (Dirección General de Ordenación del Juego) consideram tanto as vendas online quanto no canal físico.
De acordo com o IBGE, o PIB brasileiro em 2022 foi de R$ 9,9 trilhões. Desta forma, aplicando-se o percentual médio europeu de participação das empresas autorizadas, podemos estimar um mercado de R$ 6,3 bilhões de faturamento dos operadores no Brasil.
Indo mais além, considerando que o payout médio (parte dos valores das apostas destinadas a prêmios) desses operadores seja de 92,5% e aplicando-se as alíquotas estabelecidas na legislação vigente (Lei 13.756/2018) para beneficiários e pagamento de tributos e taxas (Seguridade Social, PIS, COFINS, IRPF, entidades escolares, FNSP, entidades esportivas e taxas de fiscalização), com 25 operadores (excluindo-se o valor pago a título de autorização, uma vez que o desconhecemos), alcançaríamos a cifra de R$ 1,2 bilhão.
No limite, pensando em nos equipararmos ao Reino Unido, mercado extremamente competitivo e maduro, com grande número de empresas autorizadas, a participação do GGR dos operadores atinge 0,11% do PIB. Neste caso, aplicando-se um payout de 95,0% (a concorrência tende a elevação das odds das apostas), 100 empresas autorizadas e as demais condições elencadas, atingiríamos R$ 2,6 bilhões destinados a beneficiários, taxas e tributos.
Destaque-se que os valores citados somente seriam alcançados após o processo de autorização de todas as empresas, o que implica no estabelecimento das condições (por meio de publicação de portarias), prazos para adequação (abertura de empresas no Brasil, contratação de pessoal etc.), submissão e aprovação dos pedidos de autorização, o que pode levar meses, em que pese a formalização desse setor ser basilar.
Além disso, é fundamental que o modelo de autorização a ser adotado permita atrair um grande número de operadores – possibilitando alcançar elevadas taxas de canalização (realizar acima de 80% das apostas por operadores licenciados). Ressalte-se que a incidência de imposto de renda sobre prêmios, sem o estabelecimento de limites mínimos, pode levar o apostador a empresas off-shore. Ainda, a aplicação de percentuais elevados sobre o turnover, mesmo que destinados à beneficiários legítimos, reduz a competitividade do operador autorizado, frente ao ilegal.
Por fim, apesar que os motivos arrecadatórios sejam importantes para o Governo Federal, com o repasse de recursos para esporte, segurança e educação, a regulamentação se faz necessária pela possibilidade de monitoramento dos operadores e das apostas, mitigando riscos de lavagem de dinheiro, prevenindo a ludopatia e a realização de apostas por vulneráveis (menores de idade em especial), bem como reduzindo riscos de integridade dos esportes, o que reforça, ainda mais, a criação de condições que permitam o máximo de empresas dentro da legalidade.
Iuri Castro
Engenheiro Civil e Mestre em Marketing pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Também é Doutor em Economia da Empresa pela Universidade Autónoma de Barcelona/Espanha. Possui 25 anos de experiência no mercado de loterias no Brasil como gestor de produtos, rede de comercialização, planejamento estratégico e regulador.
Fonte: Exclusivo GMB