A proposta da Medida Provisória divulgada em 11 de maio traz importantes alterações na Lei 13.756 de 2018, que legalizou as apostas esportivas no Brasil. Enquanto a lei anterior atribuía exclusivamente à União o serviço de apostas, a minuta retira essa exclusividade, porém estabelece que apenas o Ministério da Fazenda poderá autorizar o funcionamento das casas no país. No entanto, a minuta não esclarece se essa permissão será feita por meio de concessão ou simples autorização de funcionamento.
Um aspecto positivo é que não há um limite determinado para o número de casas de apostas que poderão operar, o que pode ser favorável à competitividade e ao acesso dos apostadores. Entretanto, a restrição das apostas apenas a eventos esportivos continua vigente, excluindo eleições, programas de televisão entre outros comuns no mundo.
Há duas formas conhecidas mundialmente de cobrança de impostos sobre as casas de apostas: o GGR (Gross Gaming Revenue) e o turnover. O GGR incide sobre o resultado do volume das apostas, descontando o pagamento dos prêmios, enquanto o turnover incide sobre o volume total apostado. A minuta acertadamente optou pelo GGR como forma de cobrança. Nos países que optaram pelo turnover o mercado não se desenvolveu a contento.
Há um equívoco grave em relação ao pagamento de imposto de renda pelo apostador, que permanece com uma alíquota de 30% sobre o valor excedente a R$ 2.212,00. Adotou-se a mesma tributação das loterias em geral como mega-sena, quina entre outras. Ocorre que a expectativa de ganho de uma loteria é absurdamente menor que nas apostas esportivas. Tributar o apostador desta forma poderá afastá-lo das casas regulares passando a procurar o mercado informal, trazendo como consequência um problema na efetividade do sistema regular de apostas que o governo quer implementar.
Em relação à propaganda e marketing das casas de apostas, o texto da minuta foi aprimorado, incentivando a autorregulação por meio de órgãos como o Conar, que já é bem-sucedido no controle da propaganda em geral. Além disso, a minuta inclui a obrigação de conscientizar os apostadores sobre o jogo patológico.
Foi estabelecida a proibição de as casas de apostas adquirirem direitos de transmissão de eventos esportivos, o que considero um erro, uma vez que essa fonte de receita é importante para os clubes atualmente.
A restrição da propaganda no território nacional apenas para as casas de apostas regularmente autorizadas pelo Ministério da Fazenda é uma medida acertada, pois pode direcionar efetivamente os apostadores para as casas regulamentadas.
A minuta também cria a possibilidade de o Ministério da Fazenda exigir que os provedores de internet bloqueiem o acesso dos apostadores a casas não autorizadas no Brasil. Além disso, o Conselho Monetário Nacional poderá impedir os pagamentos às casas não autorizadas.
No que diz respeito à prevenção de manipulação de resultados, a minuta atribui às entidades de organização de competições esportivas um papel protagonista nesse sentido. Entretanto, a boa prática internacional demonstra que o combate à manipulação deve ser realizado por uma ação conjunta do poder público, das organizadoras dos eventos esportivos e das casas de apostas, em regime de colaboração.
As casas de apostas serão obrigadas a adotar políticas de prevenção à lavagem de dinheiro, buscando evitar que essas atividades ilegais sejam realizadas por meio das apostas. Essa medida é fundamental para garantir a integridade e transparência do setor.
Além disso, a minuta estabelece mecanismos de fiscalização e penalização pecuniária, bem como a possibilidade de cassação da autorização das casas de apostas que não cumprirem as regulamentações definidas pelo Ministério da Fazenda. Essas medidas visam assegurar o cumprimento das normas e promover um ambiente de jogo seguro e confiável para os apostadores.
A minuta também proíbe de forma acertada a participação de determinadas pessoas vinculadas às casas de apostas, como sócios e administradores, agentes públicos responsáveis pela regulação das apostas, menores de 18 anos e qualquer pessoa que possa ter influência nos resultados das competições esportivas, como atletas, técnicos, árbitros e dirigentes. Também são proibidos agentes e procuradores de atletas, bem como dirigentes de federações e confederações esportivas. Essas restrições têm como objetivo evitar conflitos de interesse e proteger a integridade das competições.
Por fim, a minuta atribui ao Ministério da Fazenda a responsabilidade pela autorização, fiscalização e regulação das apostas por quota fixa. Essa atribuição visa centralizar as atividades relacionadas às apostas esportivas em um órgão específico, que poderá estabelecer as diretrizes e regulamentos necessários para garantir a adequada operação do setor.
Em resumo, a minuta da Medida Provisória traz alterações significativas para a regulamentação das apostas esportivas no Brasil. As medidas propostas visam garantir a transparência, segurança e integridade do setor, por meio da adoção de políticas de prevenção à lavagem de dinheiro, fiscalização rigorosa, proibição de participação de indivíduos com possíveis conflitos de interesse e a centralização da autorização e regulação no Ministério da Fazenda. Há aspectos bons e outros ruins, mas o saldo é positivo.
Luciano Andrade Pinheiro
Sócio do Corrêa da Veiga Advogados. Mestre em propriedade intelectual e transferência de tecnologia pela UNB; Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia; Presidente da Comissão de Direito Desportivo da OAB/ DF; Autor de artigos e livros jurídicos. Palestrante.