Uma prática comum na indústria de apostas consiste no oferecimento de uma conta ao cliente dentro da plataforma, permitindo aportar determinados valores de uma vez para realizar diferentes pagamentos de apostas com o saldo de sua conta virtual. Dessa forma, tanto o pagamento das apostas, quanto o recebimento dos prêmios são realizados por meio de desconto ou disponibilização de saldo dentro da conta na plataforma.
Por se tratar de uma representação gráfica do valor que está à disposição do cliente, o oferecimento dessa conta na plataforma é, diversas vezes, oferecido pela própria empresa de apostas, ou por um terceiro prestador de serviços, que pode ou não deter uma autorização do Banco Central para ofertar uma conta transacional.
Com a nova MP das apostas esportivas, este cenário possivelmente sofrerá alterações. O art. 34-A foi introduzido como uma forma de garantir que as contas transacionais sejam oferecidas apenas por instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central.
De acordo com as normas aplicáveis ao setor financeiro, contas transacionais correspondem às contas de depósito (oferecidas por instituições financeiras), ou às contas de pagamento (oferecidas por instituições de pagamento), sendo esta última a modalidade que poderia melhor se encaixar para a indústria, tendo em vista a natureza do serviço e o menor custo regulatório envolvido.
O impacto desta alteração para as empresas de apostas é considerável, na medida que as contas de depósito ou de pagamento demandam a conformidade com um arcabouço regulatório emitido pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central, que inclui o atendimento a normas de KYC (know your customer), prevenção à lavagem de dinheiro, prevenção de fraude, observância a regras de segurança cibernética, dentre outros pontos.
Toda essa estrutura demanda custos operacionais de controle, além da necessidade de deter capital mínimo, e patrimônio líquido igualmente satisfatório de acordo com as regras emitidas pelas autoridades. A obtenção de uma autorização junto ao Banco Central para operar como instituição de pagamento tem levado atualmente algo em torno de 12 meses.
Ao se confirmar essa obrigação no texto final da MP 1.182, haverá uma procura maior nessa indústria pela obtenção de autorizações para atuar de forma regulada.
Para que empresas consigam ofertar serviços sem necessariamente se submeter às normas típicas de uma empresa autorizada, algumas alternativas que podem ser analisadas, tais como a aquisição de uma instituição de pagamento já autorizada, cujo processo poderia levar até 1 ano, ou a realização de parcerias com instituições autorizadas que oferecem contas de pagamento na modalidade de Banking as a Service (BaaS), a qual parece ser a solução mais imediata, já que o processo envolveria o período de negociação com o provedor de BaaS e a integração operacional.
Vale ressaltar que existem propostas atualmente sendo discutidas pelo Banco Central, que no futuro podem potencialmente servir como uma alternativa às empresas de apostas. No contexto de pagamentos realizados por Pix, a figura do Gestor de Pagamentos, que realizaria o recebimento de recursos de um pagador em favor de destinatário final sem ser instituição autorizada, está sendo avaliada.
No momento, a figura em questão não foi criada, de forma que as alterações no arcabouço do BCB devem ser acompanhadas pelas empresas de apostas, para avaliar potenciais soluções alternativas.
De toda forma, como a MP 1.182 terá força de lei, mesmo alternativas regulatórias apresentadas pelo Banco Central não necessariamente servirão para a oferta de serviços envolvendo a indústria de apostas esportivas. Em vista disso, vale acompanhar os desdobramentos e eventuais modificações do texto envolvendo sua aprovação e conversão em lei.
Paulo Brancher
Sócio do Mattos Filho
Flavia Theresa Sassatani Vazzolla
Advogada do Mattos Filho