Publicada em 25 de julho, a MP trata de um tema que vinha mobilizando os parlamentares neste ano: a regulamentação do setor. O assunto ganhou força com a proliferação dos sites de apostas e também com investigações sobre manipulação de jogos de futebol por meio de apostas esportivas.
A brecha para que essas empresas pudessem funcionar no país veio em dezembro de 2018, quando o então presidente Michel Temer (MDB) editou uma Medida Provisória que permitiu as apostas de cota fixa (como juridicamente é conhecida essa modalidade de apostas esportivas). Convertida na Lei 13.756, de 2018, a norma previa um prazo de dois anos (prorrogável por mais dois) para que houvesse a regulamentação do setor, o que ainda não havia ocorrido.
Pela nova MP, as empresas operadoras desse tipo de loteria, conhecidas como “bets”, serão taxadas em 18% sobre a receita obtida com os jogos, descontando-se o pagamento dos prêmios aos jogadores e o Imposto de Renda devido sobre a premiação. A expectativa, segundo o governo, é de uma arrecadação de até R$ 2 bilhões em 2024, valor que pode alcançar até R$ 12 bilhões nos demais anos.
A MP já produz efeitos desde a publicação, mas ainda pode sofrer mudanças no Congresso. Depois da análise da Comissão Mista, o texto passará pelo Plenário da Câmara e depois pelo do Senado, antes de seguir para a sanção (caso haja mudanças).
Todas as emendas apresentadas podem ser conferidas aqui.
Jogos de azar
Das 244 emendas apresentadas, 57 são de senadores. Entre elas, estão oito emendas do senador Angelo Coronel (PSD-BA), defensor da legalização dos chamados jogos de azar desde o início do seu mandato. Para o senador, um dos principais argumentos é o do aumento de arrecadação, já que jogos atualmente proibidos continuam a existir sem gerar recursos para que o governo invista, por exemplo, em programas sociais.
Uma das emendas busca regularizar o jogo do bicho, sistema popular de apostas que atualmente é considerado contravenção penal. Na emenda, Angelo Coronel pede a revogação dessa proibição. “Esse tipo de jogo nada mais é que uma loteria e é amplamente conhecido e praticado no Brasil. Acredito que regulamentando o setor traremos um grande ganho de arrecadação e tiramos da clandestinidade uma atividade que é socialmente aceita”, argumenta.
Além disso, o senador quer incluir na medida a criação de um Cadastro Nacional de Indivíduos com Comportamento Suspeito de Transtorno do Jogo Patológico (emenda 31). A intenção é prevenir o transtorno do jogo patológico, inclusive com a possibilidade de restrições para que as pessoas inscritas no cadastro fiquem impedidas de fazer apostas.
Destinações
A maior parte das emendas dos senadores busca garantir a destinação de parte dos recursos arrecadados com as loterias de quota fixa para áreas específicas. Pela lei atual, já com as modificações da MP, os recursos que ficam após o pagamento dos prêmios e do Imposto de Renda sobre a premiação são divididos da seguinte maneira: 82% para as empresas de apostas; 10% para a contribuição destinada à seguridade social; 3% para o Ministério do Esporte; 2,55% para o Fundo Nacional de Segurança Pública; 1,63% para clubes e atletas que tiverem nomes e símbolos ligados às apostas; e, por fim, 0,82% à educação básica.
As senadoras Teresa Leitão (PT-PE) e Dorinha Seabra (União-TO) apresentaram emendas para diminuir o percentual que fica com a empresa de apostas e destinar mais recursos para unidades escolares públicas de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, que atualmente recebem 0,82% do total (emenda 90 e emenda 124).
Já as emendas 78, do senador Paulo Paim (PT-RS), e 234, do senador Romário (PL-RJ), retiram 0,5% do total que vai para as empresas de apostas e destinam esse percentual ao Ministério da Igualdade Racial (MIR), para ações de combate ao racismo.
A emenda 106, da senadora Leila Barros (PDT-DF), busca tornar permanente a destinação de 3% desses recursos ao Ministério do Esporte. Pela redação atual, essa destinação valerá até julho de 2028, e depois desse prazo os recursos passarão a ser recolhidos ao Tesouro Nacional e livremente utilizados pela União.
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), por sua vez, propõe reduzir de 2,55% para 1,55% o percentual que vai para o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) e destinar 1% dos recursos para o Ministério da Defesa, para aplicação em ações de controle, monitoramento, proteção e vigilância das fronteiras (emenda 113).
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) quer diminuir de 82% para 80% o total que vai para as empresas de apostas, destinando a diferença para medidas de prevenção, controle e mitigação de danos sociais causados por jogos nas áreas de saúde e de segurança pública (emenda 138). No mesmo sentido, a emenda 227, do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), busca garantir 2% dos recursos das apostas para o Ministério da Saúde, para desenvolvimento de programa específico para tratamento de ludopatia (vício em jogos de azar).
O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) quer diminuir o percentual das empresas de apostas para 77%, passando a diferença (5%) para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades Fim da Polícia Federal (emenda 222). Com teor parecido, a emenda 237, da senadora Ana Paula Lobato (PSB-MA), destina 10% dos recursos para o Funapol.
Também há pedidos para destinar recursos das empresas de apostas para incentivar a produção melífera. A sugestão está nas emendas 145, do senador Izalci Lucas (PSDB-DF), 174, do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), e 216, da senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
Outra emenda, do senador Weverton (PDT-MA), destina recursos das bets para a Confederação Brasileira do Desporto Universitário (emenda 172).
Propaganda
Algumas das emendas buscam restringir a propaganda das bets. É o caso das emendas 62, do senador Ciro Nogueira (PP-PI), que proíbe essas propagandas em escolas e universidades, e 107, da senadora Leila Barros, que proíbe esse tipo de anúncio nas emissoras de rádio e televisão entre as 21h e 6h.
A emenda 136, apresentada pelo senador Eduardo Girão, é ainda mais restritiva e proíbe a propaganda dessas empresas em todos os meios de comunicação de massa, como jornais, televisão, rádios e mídias sociais. O senador também apresentou a emenda 137, para proibir as bets de patrocinar equipes, atletas individuais e campeonatos, prática que tem sido cada vez mais comum. Também é dele a emenda 139, que proíbe as empresas de fornecer descontos, créditos ou qualquer tipo de bônus para incentivar a primeira aposta.
O senador Carlos Portinho (PL-RJ) apresentou emenda para proibir a exibição de publicidade das operadores da loteria de apostas de quota fixa por meio de plataformas digitais. De acordo com a emenda, ficaria permitida a exibição desse tipo de propaganda em rádio e TV, entre 8h e 16h (emenda 199).
Já o senador Romário quer que seja proibida a propaganda alusiva às apostas esportivas nas camisas de jogo ou treino dos atletas e treinadores, assim como publicidade estática em estádios ou arenas esportivas. De acordo com a emenda 234, de autoria do senador, fica estabelecido apenas o horário entre 21h e 6h para a veiculação de propaganda dessas empresas em rádio e TV.
Empresas
Um ponto muito criticado no sistema atual de apostas é que a maioria das empresas está sediada no exterior. A MP obriga as empresas estrangeiras que pretendam explorar apostas de quota fixa no país a se estabelecer no território nacional.
Para o senador Ciro Nogueira, essa mudança não é suficiente. Ele apresentou uma emenda para que as empresas nacionais tenham preferência para explorar o setor (emenda 61). Os critérios de preferência, de acordo com a emenda, seriam estabelecidos em regulamento do Ministério da Fazenda.
Caixa Econômica Federal
Já o senador Esperidião Amin (PP-SC) quer que a Caixa Econômica Federal seja autorizada a atuar no ramo de aposta de quota fixa, assim como as bets, em meio físico e virtual (emenda 108). Para ele, a medida ajuda a equilibrar esse mercado, hoje ocupado pela iniciativa privada.
A emenda 196, da senadora Soraya Tronicke (Podemos-MS), busca permitir às bets adquirir, licenciar ou financiar a aquisição de direitos de eventos desportivos para emissão, difusão, transmissão ou qualquer forma de exibição de sons e imagens. Para a senadora, a medida aumentaria a competição e, por consequência, traria benefícios aos consumidores.
Na Câmara dos Deputados
Na Câmara dos Deputados, foram apresentadas 187 emendas, boa parte delas alterando a distribuição do dinheiro gerado pela atividade de apostas esportivas e reduzindo ainda mais a parte que caberá às operadoras do setor.
Uma das emendas, apresentada pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP), destina 0,25% dos 3% destinados ao Ministério do Esporte, para o custeio do Bolsa-Atleta. Para Manente, o programa é fundamental para estimular o alto rendimento esportivo e democratizar o esporte. “Desde sua criação, em 2005, o programa tem contribuído significativamente para impulsionar a carreira de atletas talentosos, permitindo-lhes dedicar-se com exclusividade ao treinamento e às competições”, afirma o deputado.
Menos dinheiro para casas de apostas
O deputado Pedro Aihara (Patriota-MG) quer aumentar o percentual destinado ao Ministério do Esporte (5%). A diferença viria das empresas de apostas (que ficariam com 80%) e seria destinada exclusivamente para ações de combate à violência, racismo e homofobia em eventos esportivos.
Já uma emenda do deputado Julio Cesar Ribeiro (Republicanos-DF) reduz para 81% o valor destinado a empresas de apostas e destina 1% para secretarias de esporte dos estados e do Distrito Federal. “A atuação das secretarias é crescente, e tem sido um apoio para os projetos desportivos e políticas públicas para o setor, além de ser o executor dos estados”, defende o parlamentar.
O deputado Túlio Gadêlha (Rede-PE) também sugere reduzir o percentual das empresas (80,5%), mas para destinar uma parte (1,5%) para o Fundo Nacional da Cultura. “Cultura e arte são fundamentais para preservar a identidade de um povo, promover a diversidade cultural, estimular a criatividade e expressão individual, além de contribuírem para o crescimento econômico e o turismo cultural”, afirma Gadêlha, ressaltando que o estímulo à cultura é uma responsabilidade do Estado.
O deputado Ricardo Ayres (Republicanos-TO) quer diminuir o dinheiro que vai para as empresas de apostas (78%), mas sugere que a diferença seja destinada ao Fundo de Financiamento Estudantil (2%) e ao Programa Universidade Para Todos (2%). Já a deputada Carol Dartora (PT-PR) propõe que as empresas fiquem com 81,5% e inclui o Ministério da Igualdade Racial entre os beneficiados pela partilha (0,5%).
Fonte: Agência Câmara de Notícias e Agência Senado