JUE 19 DE SEPTIEMBRE DE 2024 - 11:34hs.
Fernando Monfardini, Compliance Officer e DPO do Atlético Mineiro

Portaria PLD/FTP para operadores de betting: Apostando na integridade

Em julho foi publicada a Portaria SPA/MF nº 1143 sobre diretrizes, políticas, procedimentos e controles internos para a prevenção à Lavagem de Dinheiro e Financiamento do Terrorismo (PLD/FTP) por parte dos operadores de apostas. “Estamos caminhando na direção certa ao integrar requisitos de conformidade em todos os aspectos da indústria”, afirma Fernando Monfardini, compliance officer e DPO (Data Protection Officer) do Clube Atlético Mineiro.

Essa é mais uma norma do arcabouço de Portarias da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, que vem regulamentando a atividade a partir da publicação da Lei 14790/23.

Eu me interessei em escrever sobre o tema por enxergar nessa Portaria um aspecto que venho falando há algum tempo: a necessidade de termos diretrizes de integridade que de fato abordem todos os aspectos da integridade.

A portaria não se trata apenas de diretrizes para PLD/FTP, mas também pontua a necessidade de se trabalhar todo um Sistema de Integridade, que abranja conformidade legal, ASG (ambiental, social e governança) e a boa governança.

Isso é um ganho regulatório significativo para o setor, pois, além de estabelecer as regras básicas para um programa de prevenção à lavagem de dinheiro, o estabelecimento de parâmetros de um sistema de integridade tal qual temos previsto em outras legislações e normas.

Dessa forma, mais do que definir regras para registro e comunicação ao COAF, avaliação de riscos, procedimentos de know your costumer (KYC), know your employee (KYE), know your supplier (KYS) e Know your Partners (KYP), cadastro e registros de operadores, apostadores, usuários, monitoramento e verificação periódicas, traz para o sistema aspectos de integridade que auxiliam tanto no Programa de PLD/FTP, como também na melhoria da gestão da companhia.

Trazendo uma abordagem prática para a discussão, podemos imaginar que, ao definir critérios ASG, a organização poderá verificar impactos mais amplos que a própria operação, como riscos trabalhistas na sua cadeia e a própria questão do jogo responsável.

Por exemplo, para cumprimento da portaria será necessário, ao criar os procedimentos de KYS e KYP diligenciar sobre questões sociais e ambientais, como ilícitos contra o meio ambiente, descumprimentos trabalhistas, sobretudo condições análogas à escravidão, além de avaliar os impactos causados pelas atividades da organização.

Ao estabelecer os parâmetros para os procedimentos de KYC será importante entender se não existem atividades criminosas extensivas ao que estamos acostumados. Por exemplo, pessoas ligadas a crimes como garimpo ilegal, extração ilegal de madeira e outros ilícitos semelhantes podem utilizar a plataforma para lavagem de dinheiro.

Importante também é entender que ao estabelecer um modelo de integridade e ESG, facilita a organização a traçar métricas importantes que podem prevenir e combater a manipulação de resultados.

Medidas educacionais, atividades de cunho social e de inclusão, apoio ao esporte de formação podem reduzir a ação de aliciadores e auxiliar na formação de crianças e jovens.

Criação de um sistema de facilite o entendimento da organização e das entidades parceiras, como um balanço social, podem também ajudar a entender locais de maior vulnerabilidade para a prática de manipulação de resultados.

Outro aspecto é que, ao estruturar um sistema de integridade com abordagens baseadas em risco de normas como ISO 31000 e COSO, a organização poderá ter uma visão muito mais ampla de suas incertezas, inclusive mitigando com mais eficiência a lavagem de dinheiro.

Sistematizar a gestão de riscos na cultura da organização trazendo aspectos do ESG para o escopo da atuação poderá direcionar a governança para uma gestão que toma decisões mais informadas e com uma visão ampla das ameaças e oportunidades que enfrentam, auxiliando na identificação de red flags e trazendo um ciclo virtuoso de melhoria contínua.

Dessa forma, ao trazer para a portaria os pilares de um sistema de integridade, a Secretaria de Prêmio e Apostas busca pautar o setor através de boas práticas de governança e integridade, ao sedimentar a necessidade de uma gestão que busque tratar de forma holística os seus impactos.

Além disso, a estruturação de um sistema de integridade baseada na legislação obriga a ter medidas de gestão de terceiros e, sendo o mercado de apostas um relevante patrocinador do esporte, poderá refletir esses parâmetros nas entidades esportivas.

Uma grande gama de parceiros das empresas de apostas esportivas serão clubes, federações e ligas, que estarão submetidos às avaliações de integridade que essas organizações terão que fazer. Neste aspecto, será importante que uma due diligence adequada seja feita para entender os riscos do negócio e direcionar medidas de redução de impacto, que terão efeitos positivos na gestão das entidades desportivas.

Por esta razão entendo que esse normativo trouxe uma contribuição moderna e relevante para o recente mercado regulado de apostas esportivas, podendo até mesmo refletir positivamente na indústria do esporte em geral. Certamente, é também um bom exemplo de como as regulações devem caminhar para tratar os desafios de mercado e sociedade de forma mais ampla.

Fernando Monfardini
Compliance Officer and DPO do Atlético Mineiro
Advogado especializado em Compliance e Anticorrupção, Controle da Administração Pública e Regulatory Compliance, com 7 anos de experiência em setores diversos, como saúde, logística, transporte, esportes e startups.