JUE 31 DE OCTUBRE DE 2024 - 05:29hs.
Udo Seckelmann e Pedro Heitor de Araújo

Regulamentação de casas de apostas e publicidade no futebol

Neste artigo de opinião para o Poder360, Udo Seckelmann e Pedro Heitor de Araújo, especialistas da Bichara e Motta Advogados, analisam a transição do mercado de apostas no Brasil e as novas medidas normativas que criam mecanismos de respaldo jurídico para certificar que operadores atuem sob controle do Ministério da Fazenda.

Atualmente, o mercado de apostas de quota fixa está em um período de transição. O momento é marcado pela espera de que a regulamentação produza todos os seus efeitos jurídicos, conforme o parágrafo único do art. 9º da lei 14.790 de 2023, conhecida como Lei das Apostas de Quota Fixa, com término estimado para 31 de dezembro deste ano.

 A partir de 1º de janeiro de 2025, os operadores de apostas em atividade no Brasil que atuam sem a devida autorização da SPA (Secretaria de Prêmios e Apostas) do Ministério da Fazenda estarão sujeitos às penalidades pertinentes. As punições poderão ser estendidas àqueles que facilitarem, incentivarem, permitirem ou, de qualquer forma, contribuírem para a atuação irregular no país.

Nesse contexto, a veiculação de publicidade e ações de marketing para operadores não autorizados configura uma infração administrativa punível, exigindo especial atenção dos anunciantes, como os clubes de futebol, que dependem economicamente dos valiosos contratos de patrocínio. Hoje, 7 dos 10 maiores patrocínios no futebol brasileiro são provenientes de casas de apostas, beneficiando clubes como Flamengo, São Paulo, Vasco, Cruzeiro, Fluminense, Santos e Botafogo.

Em termos de relevância e volume financeiro, 15 dos 20 clubes da Série A do Brasileirão obtêm a maior parte de suas receitas de patrocínio de operadores de apostas, totalizando, em conjunto, mais de R$ 450 milhões anuais arrecadados.

 



Por conta da importância dos patrocínios para a sustentabilidade financeira dos clubes, que financiam suas atividades-chave e, em última análise, resultam na produção de valor para os fãs, tornando o futebol brasileiro um produto mais competitivo na indústria do entretenimento, a iminente regulamentação exige uma reavaliação estratégica. Os clubes precisarão adotar medidas jurídicas e de conformidade específicas para assegurar a observância da Lei das Apostas de Quota Fixa, a fim de evitar sanções que possam comprometer suas receitas e suas operações.

Do ponto de vista regulatório, os clubes deverão, primeiramente, verificar se o operador de apostas é autorizado pela SPA antes de celebrar ou manter em vigor qualquer contrato de patrocínio. Depois, será necessário monitorar cenários de fusão, aquisição ou qualquer mudança no controle societário do operador autorizado que possam resultar na revisão da autorização concedida.

Devem também acompanhar possíveis infrações cometidas pelo operador que possam levar à revisão da autorização, nos termos da Lei das Apostas de Quota Fixa e das normas regulamentares sobre a matéria. Essa análise pode se revelar particularmente desafiadora para clubes de divisões inferiores ou de menor porte econômico, que podem não dispor da equipe jurídica necessária para lidar com essas novas questões.

Como resultado, os contratos de patrocínio devem incluir disposições contratuais específicas para navegar pelo ambiente pós-regulamentação com a segurança adequada. Por exemplo, cláusulas que exijam a comprovação periódica da autorização da SPA por parte dos operadores de apostas serão essenciais para garantir que os clubes estejam sempre em conformidade com as normas legais e regulamentares vigentes, mitigando riscos de infração ao fazer publicidade para operadores não autorizados.

É igualmente importante incluir cláusulas que estabeleçam a rescisão antecipada do contrato em caso de perda da autorização, protegendo os clubes de possíveis repercussões legais decorrentes de mudanças no status regulatório dos operadores. Somado a isso, cláusulas de responsabilidade civil e indenização são essenciais para estipular que os operadores devem indenizar os clubes por quaisquer perdas ou danos decorrentes de infrações à legislação ou à regulamentação aplicável.

Outro ponto de atenção é o prazo inicial do contrato e as possíveis renovações contratuais. Estes devem estar alinhados com o período de 5 anos da autorização outorgada pela SPA, bem como cláusulas de due diligence, reputação e exclusividade, que também devem ser cuidadosamente elaboradas para mitigar os riscos inerentes a este tipo de negócio.

Para os contratos em vigor, na ausência de cláusula de rescisão antecipada pela não obtenção de autorização da SPA pelo operador de apostas, o clube estará vulnerável e poderá se encontrar na indesejada situação de ter assumido a obrigação contratual de fazer publicidade de operador de apostas não autorizado enquanto tal conduta seria passível de sanção administrativa.

Portanto, a implementação dessas proteções contratuais é imprescindível para assegurar que os clubes de futebol estejam em plena conformidade com a regulamentação do mercado de apostas de quota fixa. A adoção das medidas proporcionará a segurança jurídica necessária para que os clubes possam manter suas operações de forma sustentável, mesmo diante de eventuais mudanças no status regulatório dos operadores de apostas.

É importante destacar que, embora este artigo tenha sido direcionado aos clubes de futebol, essas precauções são igualmente relevantes para qualquer anunciante envolvido no mercado de apostas brasileiro.

Udo Seckelmann
Advogado e head do departamento de Apostas e Cripto do escritório Bichara e Motta Advogados, professor da CBF Academy.

Pedro Heitor de Araújo Pedro Heitor de Araújo
Estudante de direito na PUC-RJ, atua nas áreas de Apostas e Cripto no Bichara e Motta Advogados desde 2022.