A divulgação do trabalho de agentes de persecução penal tem como efeito colateral o superdimensionamento dos crimes combatidos diante da opinião pública. Desse modo, se hipoteticamente a Polícia Federal prende um político corrupto, a corrupção na política ganha contornos de uma mazela insuperável —e não de um problema efetivamente combatido.
No caso do crime de lavagem de dinheiro, vivemos algo parecido com o avanço da Operação Integration, que prendeu influencers e empresários envolvidos tanto com jogos ilegais como com casas de apostas esportivas —as famosas bets, que são legalizadas.
Na esteira desse efeito colateral, a discussão em torno dos mecanismos de controle ganha corpo. Ocorre que o Brasil já conta com um robusto conjunto de ferramentas de combate à lavagem de capitais —inclusive no contexto das apostas esportivas e outras atividades relacionadas a jogos de azar.
De início, o país tem a lei 9.613/1998, que trata especificamente do crime de lavagem de dinheiro e que foi atualizada pela lei 12.683/2012. Além disso, possui mecanismos eficientes de investigação, como a Unidade de Inteligência Financeira (UIF).
Antigamente conhecida como Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), a UIF é responsável pelo recebimento e análise de operações financeiras consideradas suspeitas. É a primeira trincheira do combate à lavagem de dinheiro.
Também possuímos órgãos que auxiliam no combate a esse tipo de crime, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central, que supervisionam o cumprimento de normas de prevenção à lavagem de dinheiro.
É importante lembrar que as casas de apostas foram regulamentadas pela lei 13.756/2018, que estabelece as regras para apostas esportivas e pela lei 14.790/2024, que definiu a tributação desses negócios e introduziu regras de compliance.
O regramento obriga instituições financeiras e casas de jogos a implementar procedimentos de "due diligence", que incluem a verificação da identidade dos clientes, monitoramento de transações e relatórios de atividades suspeitas.
O rol brasileiro de ferramentas de combate à lavagem de dinheiro também inclui cooperação internacional. O país é membro do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), que atua de modo global contra esse tipo de crime e o financiamento ao terrorismo.
É evidente, contudo, que o combate à lavagem de capitais no âmbito das bets apresenta desafios que precisam ser superados. Existe sempre espaço para o detalhamento da legislação para que o mercado das apostas esportivas opere de forma eficiente e dentro da legalidade no país.
Também é necessário fiscalizar o mercado para que o regramento em vigor não se torne letra morta, exigir que as empresas invistam em tecnologia para coibir a manipulação de competições esportivas e também garantir a integridade dos dados dos apostadores.
E isso não quer dizer, sob nenhum aspecto, que o país não está preparado para lidar com o combate da lavagem de dinheiro no âmbito das bets. A recente operação da PF —voltemos ao começo— demonstra que o trabalho vem sendo feito pelas autoridades competentes e que não se trata de nenhum problema insolúvel.
A eficácia dos nossos mecanismos depende da combinação de regulamentação rigorosa, fiscalização eficiente e cooperação entre as autoridades e o setor privado. O combate a esse tipo de crime é perene e não deve assustar ninguém.
Anderson Almeida
Advogado criminalista, é especialista em direito e processo penal e em direito penal e criminologia