Sem dúvida alguma, muito dessa inovação foi potencializada pelo avanço e estruturação de novas soluções de pagamento, como o PIX, em grande parte encabeçadas pelo Banco Central do Brasil (BCB), premiado e reconhecido internacionalmente como um dos reguladores mais inclinados à inovação em todo o mundo.
O PIX é o mais expoente, e exemplo mais significativo dessa inclinação, mas outras iniciativas não podem ser ignoradas, como o open finance, a CBDC (Real Digital) e regulação do mercado de criptoativos e tokenização. Todos esses são traços distintivos do “jeito BCB” de regular e fomentar a economia brasileira.
Nas palavras do COA, o PIX “se tornou um modelo mundial de inclusão financeira, com bancos centrais da região (América Latina) e de outras partes do mundo tentando replicar iniciativas similares em seus mercados”.
Os dados estatísticos demonstram que, desde sua criação em novembro/2020, a solução de pagamentos PIX tem aumentado progressivamente sua margem de utilização em quase 107% ao ano. Somente em dezembro de 2022, foram realizadas cerca de 2,9 bilhões de transações via PIX, um crescimento de 1.900% quando comparado ao primeiro mês de sua utilização, ainda em 2020. Em termos de valores transacionados, para esse mesmo período (12-2022), o PIX foi responsável pela movimentação de R$ 1,2 trilhão de reais.
O padrão de uso dos brasileiros indica que 93% das transações realizadas entre pessoas físicas são viabilizadas para transferências de valores até R$ 200,00 (duzentos reais). Esse dado se revela altamente importante quando se fala do mercado de iGaming, em que os valores vertidos pelos apostadores raramente superam essa quantia, dada sua característica interativa e de entretenimento.
Em outras palavras, a política regulatória do banco central brasileiro gira em torno do interesse de viabilizar que praticamente todos os brasileiros gozem de interação com esse meio de pagamento instantâneo. A pergunta é: como setor de iGaming poderia se beneficiar dessa solução?
Com o advento da Lei n. 14.790, de 29 de dezembro de 2023, todas as empresas operadoras de apostas esportivas e jogos online precisarão, obrigatoriamente, ter algum tipo de representação física no Brasil, com sede devidamente constituída e registro no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) – art. 7º, da lei referenciada.
Tal obrigatoriedade afasta, de imediato, a pronta necessidade de operadores recorrerem ou demandarem instrumentos de eFX para viabilização e distribuição de suas receitas.
A “nacionalização” da operação traz consigo facilidades de integração e oferece a possibilidade de players internacionais simplesmente se “acoplarem” a arranjos de pagamentos já existentes no País, inclusive em matéria de PIX, desde que venham a se habilitar perante uma instituição regulada e participante direta do PIX, igualmente habilitada a oferecer tal funcionalidade e prover contas transacionais aos seus clientes.
Diferentemente da sistemática aplicável às pessoas físicas, o BCB autoriza que as instituições reguladas cobrem taxas ou tarifas para prover PIX a pessoas jurídicas. Portanto, os operadores, com a devida instalação em território brasileiro, poderão oferecer serviços PIX aos seus clientes a partir de negociações estabelecidas com instituições financeiras ou de pagamentos que possibilitem essa operação.
Para além da solução PIX, é possível que essa indústria também venha se utilizar das outas soluções colaterais que possam permitir a oferta de serviços mais amplos aos seus usuários. As Instituições de Pagamento (IPs), reguladas pelas Resoluções BCB n. 80 e n. 81, se apresentam como umas das melhores oportunidades nesse cenário. Contudo, é importante que tal empreitada “converse” com o porte da operação imaginada, de modo que não se torne precipitada essa opção.
Com soluções mais céleres e menos burocráticas, há os Gateways de pagamento e o PSP (processadores de serviços de pagamento) como expoentes alternativos para viabilizar, concretamente, operações de transferências de recursos entre operadores e apostadores. Uma solução mais moldada à necessidade operacional desse segmento, e com fácil adaptabilidade.
Por fim, como uma das soluções mais polêmicas, há o Baas (Banking as a Service), estrutura negocial que permite, literalmente, a oferta de serviços bancários em geral aos usuários e apostadores, por meio de API integrado aos próprios operadores.
Essa solução, sem dúvida alguma, desponta como uma das mais completas para esse segmento, por se constituir como uma espécie de core bancário. Entretanto, é muito importante o mapeamento de custos por parte dos operadores, já que a sua estruturação depende de subcontratação (ou melhor, da oferta) desses serviços por instituições autorizadas e supervisionadas diretamente pelo BCB, sobre as quais recairá o ônus regulatório dessa atividade.
Essa última alternativa é polêmica porque concentra atividades de crédito que, em tese, seriam disponibilizadas aos operadores. Todavia, trata-se de alternativa que, de alguma maneira, já recebeu sinalização negativa pelo Ministério da Fazenda na Portaria Normativa nº 1.330, de 2023, ao indicar que não serão admitidos instrumentos de pagamento que “ofereçam conta de pagamento pós-paga ao apostador", conforme art. 19, inciso I, desse ato administrativo.
Como se vê, portanto, a verdade é que opções e soluções financeiras para essa indústria não faltam no Brasil, cabendo aos operadores realizarem um estudo de negócios aprofundado para compreender qual solução se adequa melhor a suas necessidades e demandas imediatas.
Paulo Portuguez
Sócio do Jantalia Advogados, especialista em Direito Bancário, Direito Administrativo Sancionador e Regulação de Criptoativos. Mestrando em Direito pelo IDP.