Relator do projeto de lei que libera a exploração de cassinos, bingos e o jogo do bicho no país, o senador Irajá (PSD-TO) afirmou ao Valor que o Ministério da Fazenda é “um dos maiores entusiastas” da matéria. O parlamentar projeta uma arrecadação de até R$ 40 bilhões com o regramento dos jogos de azar e acredita que o turismo brasileiro vai dobrar o número de visitantes em até oito anos com a vigência da nova legislação.
Irajá está confiante na aprovação da matéria, cuja votação está prevista para esta quarta-feira (12) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A expectativa é que a deliberação em plenário ocorra antes do recesso parlamentar, em 18 de julho, para depois seguir à sanção presidencial. O texto já passou pela Câmara dos Deputados.
Em entrevista exclusiva ao Valor, Irajá relatou que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é favorável ao projeto. “Eles [do Ministério da Fazenda] são dos mais entusiastas. Eu vejo pelo lado social do projeto, e a Fazenda, como é o dever dela, olha pelo lado econômico. A arrecadação vai ser algo fabuloso para o país”, declarou.
Embora a Fazenda não defenda o projeto publicamente, Irajá diz que, reservadamente, “Haddad diz ser favorável porque entende que é bom para o país”.
O ministro do Turismo, Celso Sabino, por sua vez, é apontado pelo relator como “um dos grandes defensores” do texto.
“[O ministro do Turismo] está superanimado e confiante também na aprovação dessa matéria. Nós estamos apostando muito que o Brasil vai ter nos resorts integrados uma grande âncora do turismo mundial e pode conseguir dobrar o número de turistas no universo de cinco a oito anos”, afirmou Irajá.
Ao Valor, Sabino confirmou que tem acompanhado a tramitação. Ele contou que tem recebido investidores internacionais interessados em fazer aportes no país para a construção de resorts com cassinos em diversas regiões.
Segundo o ministro, há acordo entre governo e lideranças do Legislativo para que o tema avance. “Há pleno ânimo e acordo entre o ministro do Turismo, Arthur [Lira], [Rodrigo] Pacheco, Davi [Alcolumbre] e os relatores para aprovar esse projeto”, explicou Sabino.
“A liberação de resorts integrados no país vai permitir que o turismo nacional viva uma outra realidade, um novo momento, de muito mais turistas transitando pelo país, gerando milhares de novos empregos e bilhões de reais em investimentos”, completou.
Apesar da resistência da bancada evangélica, que se articula para rejeitar o texto, Irajá acredita que o projeto irá avançar. O termômetro, na visão dele, foi a votação do projeto que liberou os jogos online, no final de 2023.
“Esse tema dos jogos de apostas não é unânime, nem de longe. Nós sabemos disso e nem esperamos que vá ter um placar elástico. Mas, em conversas com os partidos, com os colegas, eu acredito que teremos uma votação majoritária”.
O senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da Frente Parlamentar Evangélica, reforçou que a bancada seguirá contra o projeto. “Não há hipótese de sermos a favor dos jogos de azar. Isso só vai servir para lavar dinheiro. Entendemos que o dinheiro gerado a partir dessa regulamentação não compensa o prejuízo que isso traz para a sociedade”, argumenta.
Para o relator, o projeto é alvo de uma visão “preconceituosa” e ideológica por parte dos colegas. “Eu acho que existe um certo preconceito. Muitos argumentam a questão de evasão de divisa e de sonegação fiscal. Porque se tinha ideia de que as pessoas vão hoje no resort integrado, em um bingo, pegam lá uma mala de dinheiro e jogam. Isso não existe mais. Hoje todo o processo é eletrônico”, ponderou.
“Com relação à questão do vício, hoje qualquer pessoa com celular joga. Se ele não vai jogar aqui no país para arrecadar os impostos para cá, ele vai jogar em outro lugar. Eu respeito as opiniões, mas os argumentos não se sustentam. Não conheço um país civilizado que tenha regulamentado os jogos e que tenha voltado atrás”, acrescentou.
O relator fez apenas ajustes redacionais no texto aprovado na Câmara, não de mérito (o que faria a matéria voltar para a Câmara). Uma delas retira a previsão de que os resorts onde serão instalados os cassinos devam ser construídos do zero e prevê que basta as edificações serem “destinadas” a este tipo de atividade.
“Vamos promover um ajuste redacional trocando a palavra ‘construídos’ para ‘destinados’. Aí pode ser um projeto do zero ou um projeto pré-existente. Não podemos eliminar a perspectiva de explorar os empreendimentos nacionais que já estão aí”.
Questionado sobre o número de licenças para a exploração estar ligado a questão populacional dos estados e municípios, Irajá argumentou que a limitação foi uma maneira de fazer o projeto avançar. Pelo texto, cada estado terá direito a um cassino, tirando São Paulo, que poderá ter três, e Rio de Janeiro, Minas Gerais, Amazonas e Pará, que contarão com no máximo dois. Para o jogo do bicho, a previsão é de um ponto a cada 700 mil habitantes, e, para bingos, a regra é de um a cada 150 mil pessoas.
“Eu acho que o mercado é que deveria definir as quantidades. Porque são as empresas que vão fazer esses investimentos que vão dizer se é viável. Dito isso, como é uma coisa nova e a gente está dizendo tanta coisa de preconceito, de resistência, acabou se optando por um projeto mais conservador. Se der certo, a tendência é a gente ampliar essas licenças”, afirmou.
Irajá vê como positiva a regulamentação do jogo do bicho e não teme que a nova regra possa interferir em eventuais disputas entre os atuais exploradores da modalidade. “Essa disputa sempre aconteceu e não estamos aqui para arbitrar isso. Vamos organizar isso trazendo para a legalidade o que hoje é ilegal. O que não pode é fazer de conta que não existe”, declarou.
O relator explicou ainda que, caso o jogo do bicho seja regulamentado, a exploração ilegal da modalidade não será mais enquadrada como contravenção, passando a configurar crime.
Irajá afirmou que a regulamentação do Sistema Nacional de Jogos e Apostas (Sinaj) ficará a cargo do Poder Executivo.
“Existe uma discussão se o Ministério do Turismo poderá apontar o local de licenciamento ou se será o Ministério da Fazenda”, declarou o relator.
Procurado, o Ministério da Fazenda não se manifestou.
Fonte: Valor