Parlamentares bolsonaristas alegam razões sanitárias para opor-se ao PL que autoriza o funcionamento de cassinos no Brasil. Para eles, a medida agravaria o já sério problema do vício em jogos.
É comovente ver esse pessoal que pontificava contra as vacinas quando morriam 4.000 brasileiros por dia de Covid-19 preocupado com a saúde pública. Nunca é tarde para converter-se à medicina baseada em evidências.
Mesmo que se admita essa hipótese mais benigna, é forçoso reconhecer que há algo errado com o timing desses congressistas. Hoje, qualquer indivíduo com um smartphone e um cartão de crédito já carrega um cassino no bolso, tendo acesso irrestrito, em sites brasileiros e estrangeiros, a qualquer modalidade de jogo conhecida ou por criar. Aliás, ao procrastinar por vários anos a "nacionalização" das apostas em resultados esportivos, o Parlamento fez com que o Tesouro perdesse um volume considerável de arrecadação de impostos, que escorreu para outros países.
A diferença entre os cassinos e o status quo é que os primeiros ainda geram alguns postos de trabalho, como os de crupiê, garçom e prostituta (no Brasil a atividade é legal, não custa lembrar), que inexistem na modalidade virtual.
O problema do jogo patológico é real. E quanto mais oportunidades de aposta houver, mais pessoas cairão em padrões compulsivos de comportamento. Mas a resposta adulta para essas questões não é proibição, que aliás soa patética num mundo com internet. Lidar com as próprias compulsões é um ônus individual. Um dos mais disseminados problemas de saúde mental no Brasil é o alcoolismo, mas ninguém defende seriamente que fechar todos os bares do país seja a solução.
Como sempre digo aqui, precisamos ser minimamente coerentes. Não dá para invocar o princípio da autonomia individual para justificar a legalização das drogas e do aborto, mas ignorá-lo quando o assunto é jogo.
Hélio Schwartsman, em sua coluna na Folha