Além de artista consagrado, Agnaldo Timóteo atuou como parlamentar em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. O músico concedeu uma entrevista ao jornalista Luiz Carlos Prestes Filho para sua série de artigos que publica diariamente no site Tribuna da Imprensa Livre sobre a legalização dos jogos no Brasil:
Luiz Carlos Prestes Filho: Qual é a sua visão sobre a importância da regulamentação dos jogos no Brasil?
Agnaldo Timóteo: Antes de mais nada, entendo que o cidadão deve ter a liberdade de gastar o seu dinheiro como desejar. O Estado, neste caso específico, não pode impor a sua autoridade. Porque o cidadão tem que ir a Las Vegas ou a Punta del Leste para realizar suas apostas em dinheiro? Um absurdo. Mas pelo que acompanho, hoje a Câmara dos Deputados de Brasília deseja legalizar os Cassinos-resort. Cassino é coisa para rico, temos que legalizar o Jogo do Bicho que é o jogo do povão, que não vicia, que é democrático e 100% honesto!
Como deputado federal quais foram os encaminhamentos feitos a favor da regulamentação?
Como legislador, infelizmente, nunca encaminhei um projeto específico sobre jogos. Mas sempre que o tema era pautado eu realizava pronunciamentos radicais a favor da liberdade de jogar. Até porque sempre fui muito bem tratado pelos bicheiros. Eu não tive o privilégio dos os ex-presidentes Tancredo Neves, Fernando Collor ou Fernando Henrique Cardoso. Eles podiam pedir dinheiro nas Federações das Indústrias ou nas Associações Comerciais. Caso eu tivesse cargos no executivo, eu poderia pedir dinheiro para as minhas campanhas na Shell ou no conglomerado da indústria automotiva. Nunca tive esse privilégio. Então pedi e recebi dinheiro do Jogo do Bicho. Inclusive para minhas atividades artísticas.
Nunca escondi que os bicheiros sempre me trataram com dignidade ao longo de minha vida e trajetória musical. Gostaria de destacar que os bicheiros, que tanto me ajudaram nunca pediram nada em troca. Eu sou um cantor romântico, não tenho nada para dar além da minha voz. Agora fica a dúvida. Será que os empresários e as empresas, as federações das indústrias e as associações comerciais pediram algo em troca para apoiar os ex-presidentes da República acima citados?
Todos os jogos devem ser regulamentados?
Isso deve ser resolvido pelos experts. Pode ser que existam alguns impedimentos para algumas modalidades. Mas repito, tem que legalizar o Jogo no Bicho. Esta é uma prática centenária em nosso país. E eu sou brasileiro. O Jogo do Bicho é como o samba e o carnaval. Uma tradição popular de apostas que atravessou todos os regimes democráticos e os governos militares autoritários, ao longo da História da República do Brasil. Hoje trabalham como apontadores das apostas nas calçadas e em outras atividades diretas, mais de um milhão de profissionais. Claro que estes trabalhadores pagam os impostos de autônomos para, quando chegar a idade de se aposentar, viver com dignidade. Estes profissionais não podem declarar que trabalham para o Bicho. Então, escolhem outras profissões como porteiros, mecânicos, eletricistas, bombeiros ou motoristas, entre outras. Porque não trazer esse um milhão de brasileiros para a legalidade? Os bicheiros desejam abertamente contribuir para com o desenvolvimento social.
É pura hipocrisia os órgãos fiscais e policiais – todos os anos – anunciarem em tom de descoberta, da existência de dinheiro da contravenção. Depois de mais de 100 anos de existência, o Jogo do Bicho de repente é descoberto. Movimenta dinheiro sujo! Querem me convencer que o meu dinheiro e o dinheiro de milhões de brasileiros, que todos os dias apostam no Bicho, é sujo! Querem que eu acredite que somente o dinheiro da Mega Sena, da Quina, da Loto e das corridas de cavalo que é limpo? Isso é uma imoralidade! Quando surgem movimentos contra os bicheiros eu percebo que na verdade os governantes desejam tomar para as suas mãos essa modalidade de jogo que nunca teve falcatruas. Pois, nunca aconteceu no Jogo do Bicho algo como a fraude dos Anões do Orçamento. Quanto foi triste ver políticos e executivos do Governo Federal metendo a mão, roubando dinheiro público das loterias administradas pela Caixa Econômica Federal (CEF).
Qual sua opinião sobre a Lei das Contravenções Penais?
Uma aberração! Os efeitos da Lei nº3688 devem ser anulados. Estamos num mundo diferente de 1941. A Legalização do Jogo do Bicho é algo fundamental hoje. Mas a autorização deve considerar que esta modalidade de apostas que deve ser administrada por aqueles que entendem. Não podemos permitir que o Jogo do Bicho legal seja transformado numa estrutura para criar mais cabides de empregos para os apaniguados dos burocratas do executivo, do legislativo e do judiciário, Assim são as loterias administradas pela CEF. Vejo sempre uma pressão das autoridades governamentais, em tentar criar uma fórmula que promova o esgotamento pelo interesse popular nas apostas do Jogo do Bicho. Tanto que inventaram a Loto, a Mega Sena, a Quina, as Loterias Esportivas e as Raspadinhas com este intuito. O Jogo do Bicho é tão espetacular que sobreviveu a todas essas investidas.
Você conheceu o Castor de Andrade, o Carlinhos Maracanã, o Luizinho Drummond e é amigo do Anísio Abraão David. Qual sua opinião sobre a contribuição deles para com a cultura brasileira?
Veja, quando fazem denúncias contra os bicheiros nunca contabilizam o que eles investiram em eventos culturais. Quanto o Natal investiu, ao longo de sua vida, na Portela, junto com o Carlinhos Maracanã? Quanto o Castor de Andrade investiu na Mocidade Independente de Padre Miguel? O Luizinho Drummond na Imperatriz Leopoldinense, o Ailton Guimarães Jorge na Vila Isabel e o Anísio Abraão David na Beija-Flor de Nilópolis? Será que acham que essas escolas se estruturaram somente da arte do samba? O samba tem sua força, evidentemente, mas os bicheiros sempre chegaram junto. Chegou a hora de reconhecer isso abertamente.
LUIZ CARLOS PRESTES FILHO
Diretor Executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Cineasta, formado em Direção de Filmes Documentários para Televisão e Cinema pelo Instituto Estatal de Cinema da União Soviética; Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local; Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009); É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).
Fonte: Tribuna da Imprensa Livre