GMB - Quais serão as tarefas da nova comissão?
Flavio Zveiter - A indústria de loterias e jogos apresenta vulnerabilidades significativas para atuação do crime organizado e lavagem de dinheiro. O ambiente regulatório é fundamental para que se possa desenvolver esta atividade com segurança e a OAB tem condições de contribuir muito nisso.
Estudo da Universidade de Nevada, em Las Vegas, sobre a relação entre jogo e crime organizado aponta que a forma mais efetiva de combater o jogo ilegal, a ação do crime organizado e prevenir a lavagem de dinheiro é com boa regulamentação, monitoramento eficiente e controle efetivo. Na prática, o jogo legal combate o jogo ilegal.
Pretendemos com a Comissão atuar proativamente em diversas frentes e promover um debate amplo sobre as diversas modalidades de jogos, afim de que possamos no curto prazo alcançar um ambiente regulatório que de segurança para todos os envolvidos. Pretendemos organizar eventos acadêmicos, participar ativamente das discussões no Congresso e junto aos órgãos do Governo e tudo mais que se puder fazer para que o Brasil finalmente tenha uma regulamentação adequada para jogos.
Além de você, quais são os advogados que compõem a comissão?
A comissão tem como vice-presidente o Pedro Trengrouse que é uma referencia no assunto. Esperamos poder contar também com grandes juristas que já tem trabalho na área. Ives Gandra Martins, por exemplo, já escreveu sobre regime tributário especial para jogos e diversos pareceres sobre bingos e loterias, Eros Roberto Grau deu recentemente um parecer sobre jogos para financiamento de instituições beneficentes e Miguel Reale Jr. fez um parecer primoroso sobre o Poker
Como nasceu e qual a ideia da OAB ao criar essa comissão?
A ideia nasceu do artigo assinado pelo Presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz , com o Vice-Presidente da Comissão, Pedro Trengrouse, publicado no Globo em 2018 pedindo regras claras para o jogo no Brasil.
Conte-nos um pouco sobre sua carreira e sua experiência na área de jogos e apostas.
Sou membro do Comitê de Ética da FIFA onde participei de alguns painéis que envolviam manipulação de resultados de partidas de futebol no mundo, e em todos eles havia a participação de grupos que praticam a aposta esportiva de maneira ilegal. Estudando o assunto aprendi que a falta de regulamentação é ambiente fértil para a pratica do chamado matchfixing, mas a regulação, ao contrario, pode ajudar no desenvolvimento do esporte já que pode criar uma nova fonte de receita. Recentemente escrevi junto com o Pedro Trengrouse um artigo publicado na SOCCEREX onde defendemos que um percentual da receita obtida com as apostas seja revertida aos organizadores das competições afim de que seja desenvolvido mecanismos de controle da integridade.
Como analisa o processo de legalização dos Jogos no Brasil?
O Brasil está muito atrasado nisso e precisa de mudanças profundas no seu mercado de loterias e jogos para que possa gerar benefícios sociais e econômicos relevantes, além de mitigar os riscos inerentes ao jogo ilegal.
Estudo da Fundação Getulio Vargas, pedido pelo Ministério da Fazenda à Caixa Econômica Federal, aponta que o mercado maduro de loterias e jogos no Brasil, com a devida regulamentação para todas as modalidades e ambiente propício ao seu desenvolvimento, tem o potencial de movimentar anualmente R$ 174,7 bilhões, com apostas per capita somando R$ 765,73 e arrecadação tributária de R$ 58,78 bilhões. Mesmo que esses números estejam superestimados, estamos falando de bilhares de reais.
A título de ilustração, nos Estados Unidos, estima-se o impacto econômico da indústria de cassinos em USD 240 bilhões/ano, com a geração de 1,7 milhão de empregos, USD 38 bilhões em impostos e externalidades relevantes na indústria do turismo: Las Vegas recebe mais de 43 milhões de visitantes por ano. O Japão, que possui atualmente 4,5 milhões de máquinas caça níqueis, uma para cada 28 habitantes, já iniciou processo de concessão de 3 licenças para Cassinos Resorts. Na Colômbia, loterias e jogos movimentam 1,5% do PIB. Em Macau, maior mercado do mundo atualmente, o jogo elevou o PIB de US$ 7 bilhões, em 2002, para US$ 45 bilhões, em 2016.
Planeja ter reuniões com o Ministério da Economia para ajudar a regulamentar as apostas esportivas? Acredita que ela deve estar pronta ainda esse ano?
Sim. A ideia é pedirmos audiência com o Ministro da Economia para que possa contar com a OAB nesse esforço de construção da regulamentação para apostas esportivas no país, que deve avançar o mais rápido possível. Estimasse que as apostas esportivas no Brasil já movimentam mais de R$ 4 bilhões por ano em sites internacionais que operam livremente no país, isso sem nenhum controle e monitoramento das apostas o que coloca em risco a integridade do esporte.
Como analisa o demorado processo de concessão da Lotex? Acredita que ele teve falhas?
Eu não acompanhei de perto o processo de concessão da Lotex, mas fato é que o marco regulatório é confuso e isso pode ter sido um dos motivos da falta de interesse do mercado na Lotex.
Observa uma posição clara desse novo governo de Jair Bolsonaro relacionada ao jogo?
O Brasil acabou de promulgar a lei 13.756/18 que entre outras questões, cria a modalidade de apostas esportivas no Brasil. A lei foi sancionada pelo presidente Michel Temer em dezembro do ano passado, ou seja, após a eleição do presidente Jair Bolsonaro e ela prevê que parte do produto da arrecadação das apostas esportivas, tanto no meio físico quanto no virtual, será destinado ao pagamento ao Fundo Nacional de Segurança Pública, o que é uma bandeira do presidente Bolsonaro. Isso é sem duvida um primeiro passo para a legalização dos jogos e apostas no país.
Além disso o Presidente Jair Bolsonaro por diversas vezes afirmou que o Brasil tem de adotar princípios liberais, baseados na defesa da liberdade individual contra a intervenção do poder estatal. O Emprego desses princípios levará a legalização do jogo no país, que diga-se nunca foi votada no Congresso. Além disso, uma das suas promessas é justamente priorizar o crescimento e a criação de empregos. A regulamentação inteligente e eficiente da indústria do jogo no Brasil é uma ferramenta para isso e a OAB esta a postos para colaborar sem dogmas na discussão sobre a regulamentação do jogo no Brasil, com responsabilidade, objetividade e inteligência.
O Brasil deveria buscar conselho de empresas e reguladores estrangeiros para fazer uma boa regulamentação das apostas esportivas?
Sem dúvida precisamos aprender com os erros e acertos da regulamentação em outros países. É fundamental conhecer profundamente as melhores práticas internacionais para que o Brasil possa ter regulamentação própria, inteligente e eficiente.
Você é um homem com grande relação com o mercado internacional... como o mundo vê o Brasil?
A indústria do jogo enxerga muito potencial no Brasil, mas, tem certo ceticismo já que há muito tempo fala-se em regulamentar o jogo, algo que ainda não ocorreu.
Fonte: Exclusivo GMB