VIE 29 DE NOVIEMBRE DE 2024 - 02:33hs.
Rodrigo Caldas de Carvalho Borges/Bruno Perman

Apostas esportivas e o fim do monopólio das loterias

Os advogados Rodrigo Caldas de Carvalho Borges e Bruno Perman assinam hoje uma coluna no site de análise e opinião JOTA na qual afirmam que a Indústria dos jogos ganhou mais uma alternativa para se desenvolver no país, em razão do fim do monopólio da União. “A exploração da indústria de jogos no Brasil é apenas uma questão de tempo, sendo muito bem vinda no atual cenário frente ao seu potencial arrecadatório e o potencial número de empregos a serem criados”, explicam os especialistas.

Em 12 de dezembro de 2018 foi editada a Lei nº 13.756, a qual instituiu as “apostas de quota fixa” definidas como “sistema de apostas relativas a eventos de temática esportiva em que é definido, no momento de efetivação da aposta, quanto o apostador pode ganhar em caso de acerto do prognóstico”.

Em outras palavras, há cerca de dois anos o Brasil abriu a possibilidade de exploração do mercado das apostas esportivas, indústria que movimenta mais de 210 bilhões de dólares e emprega mais de 220 mil pessoas.

De acordo com a legislação em questão, caberia ao Ministério da Economia editar a regulamentação específica da matéria e definir os requisitos para o funcionamento e concessão de autorização às casas de apostas.

Passados mais de dois anos desde a publicação da norma e, apesar das consultas públicas promovidas pela Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria (SECAP) e diversas iniciativas no sentido de ouvir os players e especialistas para edição das regras específicas, a pandemia do Covid-19 acabou adiando os planos da SECAP e até o presente momento não se tem uma definição de como e quando a indústria das apostas esportivas terá início efetivo no país.

Recentemente, o BNDES foi designado, dentro do programa de desestatização do governo federal, para gerenciar o plano de concessão de autorizações para o funcionamento das casas de apostas do Brasil, observadas as regras e diretrizes a serem editadas pela SECAP.

Na análise da ADI 4986 e ADPF’s 492 e 493, em que a Associação Brasileira de Loterias Estaduais e a Loteria Estadual do Rio de Janeiro questionavam a legalidade do Decreto-Lei nº 204/1967 que impunha limitações à atuação dos estados nas atividades lotéricas, o STF, por unanimidade, decidiu por afastar o monopólio da União, afirmando que todos os estados e municípios estão autorizados a operar diretamente ou licitar serviços de loterias, em seus territórios.

Apesar do fim do monopólio da exploração, o STF determinou que a competência legislativa da matéria permanece sob controle do governo federal, cabendo à União definir as categorias e modalidades de loterias a serem exploradas pelos estados.

Dessa forma, caberá à SECAP a uniformização das regras, tanto sob a exploração das loterias pelos estados, quanto pela exploração das apostas esportivas pelos particulares.

Em relação às loterias a SECAP já demonstrou preocupação com a lealdade federativa e concorrência justa, no intuito de evitar uma concorrência entre estados, contudo, com os avanços da tecnologia, sobretudo no mercado de apostas – que tem forte apelo no digital – resta a dúvida de como a SECAP conseguirá evitar a concorrência entre os estados, respeitando seus respectivos territórios, e evitar que interessados busquem as loterias estaduais que lhes assegurarem melhores condições.

A partir da decisão do STF, o Maranhão foi o primeiro estado a reinstituir a loteria estadual, tendo aprovado o PL 359/2020 pela Assembleia Legislativa do Estado, pendente a sanção do governador Flávio Dino.

No projeto de lei está prevista a exploração por Sociedade de Economia Mista vinculada à Secretaria de Estado de Governo, a qual pode delegar – mediante permissão concessão ou parcerias – as atividades exclusivamente operacionais, respeitando as modalidades lotéricas previstas na Lei Federal.

Na mesma linha, a Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo aprovou o PL 601/2020, no qual fica determinada a exploração das loterias de forma direta ou indireta pela Secretaria da Fazenda Estadual, pendente a sanção pelo governador Renato Casagrande.

Vale lembrar que, apesar das limitações e dificuldades impostas pelo Decreto-Lei nº 204/1967, algumas loterias estaduais permanecem em operação – ainda que tímida em decorrência da insegurança jurídica até então – e muitas amparadas em decisões judiciais, quais sejam Rio de Janeiro, Minas Gerais. Paraíba e Ceará.

Esses estados poderão, inclusive, ampliar as modalidades lotéricas existentes, eis que o pronunciamento do STF é claro quanto a permissão de exploração pelos estados de todas as modalidades previstas na lei federal (Lei nº 13.756, de 12 de dezembro de 2018).

A LOTERJ, autarquia do Estado do Rio de Janeiro responsável pela exploração de jogos, já deu o primeiro passo em caminho da ampliação, tendo aberto audiência pública para licitação de novas modalidades lotéricas no estado[2].

Como vimos, a exploração da indústria de jogos no Brasil é apenas uma questão de tempo, sendo muito bem vinda no atual cenário frente ao seu potencial arrecadatório e o potencial número de empregos a serem criados.

Sob o aspecto regulatório, o controle da União, por meio da SECAP, permitirá uma pacificação e uniformização das regras, reduzindo o potencial de insegurança jurídica, contudo, será fundamental a busca por mecanismos próprios de controle – inclusive por meio de empresas experientes e especializadas na matéria – a fim de obter um maior controle e monitoramento, tanto das apostas esportivas, quanto das loterias estaduais, no intuito de evitar a lavagem de dinheiro e manipulação de mercado, além de assegurar ao Estado o potencial arrecadatório desta indústria.


Rodrigo Caldas de Carvalho Borges 
Advogado especialista em negócios digitais, sócio no CB Associados e membro fundador da Oxford Blockchain Foundation.

Bruno Perman
Advogado especialista em relações governamentais, sócio no Perman Advogados Associados e ex-Presidente do Irelgov – Instituto de Relações Governamentais.