JUE 28 DE NOVIEMBRE DE 2024 - 23:57hs.
Opinião - Gildo Mazza, jornalista especializado do GMB

Jogo de azar no Brasil é legal só para o governo e está na hora disso mudar

Nesta semana vimos em praticamente todos os jornais, sites de notícias e na TV a repercussão da visita do famoso jogador de futebol Gabigol e do cantor MC Gui a um cassino clandestino e o que mais se falou sobre isso foi o fato dos jogos de azar serem proibidos no Brasil. Só nesta semana, foram feitas blitz e apreensões em pelo menos uma dezena de bingos e cassinos clandestinos no estado de São Paulo. Operações idênticas foram realizadas no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

Minha primeira consideração é sobre as blitzen em si. Os frequentadores desses locais estavam errados? Claro que sim, pois o momento grave que passamos por conta da pandemia de covid-19 nos coloca na responsabilidade de manter afastamento social. Não devemos ir a cinemas, teatros, bares, restaurantes e até mesmo praias. Isso vale para cassinos ou bingos.

Se fossem atividades regulamentadas, essas casas com certeza estariam fechadas, respeitando os decretos de interrupção de atividades não essenciais. Manteriam suas portas fechadas como tem sido feito por praticamente todos os pontos de comércio não fundamentais.

Me pergunto por que aquele porno-deputado que saiu gravando a blitz no cassino clandestino onde Gabigol foi encontrado não vai para a periferia de câmera na mão gravar os pancadões que acontecem praticamente todas as noites em São Paulo e exigir da polícia o encerramento dessas festas regadas a bebida, lotadas e com praticamente todos os frequentadores sem máscaras. Porque não dá ibope. É mais legal buscar um lugar de classe para chamar a atenção para si mesmo e não para o problema de saúde pública que o Brasil vive.

O jogador do Flamengo e o cantor devem ser punidos ou apedrejados por terem ido a um cassino clandestino? Claro que não... Eles erraram em ir a um local com aglomeração. Se tivessem ido a um restaurante de portas fechadas ou a uma balada, também estariam errados e deveriam ser criticados por não respeitar o isolamento social. Ponto final.

A segunda consideração me faz pensar nas diversas modalidades de loterias exploradas pela Caixa Econômica Federal, apenas para citar o governo central, que podem ser consideradas como jogos de azar. O são, na realidade, embora permitidos em lei. Então na minha opinião, o jogo de azar não é proibido, desde que seja explorado oficialmente.

O conceito clássico de jogo de azar diz que o resultado de ganhar ou perder não depende da habilidade do jogador, mas sim da questão das probabilidades de acerto ou erro nos palpites, seja na Mega-Sena, Quina, Lotofácil e tantos outros modelos. Diferentemente do que acontece com apostas no turfe, nas apostas esportivas e no pôker, por exemplo, em que o conhecimento do apostador nos cavalos, nos prados, nos times de futebol ou a sua habilidade mental de entender o próximo passo em uma mão de pôker podem levá-lo à vitória.

Mesmo em cassinos, alguns jogos dependem da habilidade mental do jogador, como é o caso do blackjack, enquanto nas máquinas o acerto não depende de estudos ou conhecimento, mas sim da própria sorte em fechar uma ou várias linhas e até mesmo ganhar um jackpot.

Por tudo isso, entendo que o Brasil precisa se reestudar e tirar a máscara da hipocrisia, muitas vezes fomentada por pseudomoralistas, e deixar de achar que o jogo de azar é um malefício ao país. Nada disso. O jogo de azar, mesmo clandestino, gera milhares de empregos, consumo e renda. Só o governo não vê esse dinheiro na forma de impostos e na formalização de postos de trabalho.

E o jogo de azar “legal”, da Caixa Loterias, mais uma vez para citar a entidade federal permitida, tem razões de sobra para se orgulhar. A Mega-Sena, por exemplo, acaba de completar 25 anos e já pagou R$ 27,5 bilhões em prêmios desde seu lançamento. Somente em 2020 foram repassados para diferentes áreas, como educação, saúde, cultura, esporte, segurança e seguridade, mais de R$ 8 bilhões. No ano passado, as Loterias Caixa registraram números recordes, com arrecadação de R$ 17,1 bilhões em apostas.

No dia 30 de abril o Brasil completará 75 anos sem jogos de azar, quando foram proibidos pelo presidente Eurico Gaspar Dutra, incentivado por sua esposa muito religiosa, que o forçou a alegar que o jogo não era condizente com a moral e com a religião. Mas não foi só por isso. Brigas políticas contra diversos opositores, inclusive Getúlio Vargas, que regulamentou o jogo, foram encobertas pela decisão “moral e religiosa do povo brasileiro”, como consta do seu decreto acabando com a atividade. Dá para imaginar, considerando os números da Caixa Loterias, quanto o país deixou de arrecadar ao longo desse período? Essa análise tem sido feita por muitos especialistas e envolvidos com a possibilidade de as atividades voltarem à legalidade

Temos publicado no GMB inúmeras matérias sobre a questão de arrecadação com todas as modalidades de jogos, que poderia injetar até R$ 50 bilhões na economia, além de gerar mais de 700 mil empregos diretos, como defende o Senador Angelo Coronel, relator do PL 2648/19 que dispõe sobre a legalização do setor.

Então, o momento é agora, como eu mesmo já disse em outras matérias de opinião aqui no GMB. A liberação dos jogos no Brasil é um tema que se arrasta há décadas e está na hora de as autoridades se debruçarem com afinco e com urgência para regulamentar de vez a atividade, que irá dar um grande alento à economia, tão massacrada pela pandemia de covid-19.

Gildo Mazza
Jornalista do GMB, especializado no setor de jogos há 25 anos