MIÉ 27 DE NOVIEMBRE DE 2024 - 22:42hs.
Coluna no UOL

Reinaldo Polito: Façam suas apostas porque o jogo vai ser liberado

O conhecido escritor Reinaldo Polito dedica sua coluna no UOL ao tema da legalização dos jogos de azar no Brasil, que esta semana pode ter novidades importantes. “Seria possível movimentar o turismo e fazer com que os brasileiros que hoje viajam para fazer suas apostas fora do país deixassem o dinheiro dentro da nossa economia”, afirma Polito.

Você sabia que Fiodor Dostoievski e Leão Tolstoi, dois dos mais importantes expoentes da literatura mundial, eram viciados em jogos de azar? Ambos transportaram, de maneira magistral, para as personagens de suas obras a terrível experiência de serem obstinados pela jogatina. Dostoievski no livro "O jogador", e Tolstoi em "Guerra e paz”.

A roleta está quase girando

Esse tema é hoje um dos mais importantes na vida dos brasileiros. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse que o projeto que legaliza os jogos de azar poderá ser votado nos próximos dias. Segundo certos analistas, Lira procurou afastar algumas resistências de parte dos deputados.

Por exemplo, pôs em pauta a MP que concede benefícios imobiliários àqueles que pertencem à segurança pública, conhecida como a bancada da bala. Colocou sobre a mesa também a lei que flexibiliza o uso dos defensivos agrícolas, uma espécie de carta tirada da manga, já que estava hibernando nas gavetas da Câmara há 20 anos.

Bolsonaro é contra

A disposição de Lira para legalizar os jogos é tamanha que está querendo aproveitar as votações remotas, pois assim arrefece as objeções daqueles que se mostram contra a aprovação do projeto, em especial a bancada dos evangélicos. O próprio presidente Jair Bolsonaro já se pronunciou contra a volta dessa atividade. Disse que irá vetar o projeto.

Os jogos de azar sempre tiveram a resistência dos religiosos. Dizem que os cassinos foram fechados pelo presidente Eurico Gaspar Dutra em 1946 por influência de sua esposa, dona Carmela. Só para dar uma ideia, ela era beata até no nome, todos a tratavam de dona Santinha. Naquela época houve, na verdade, uma conjunção de fatores.

Religião e política

Dona Santinha era extremamente religiosa e, por isso, detestava os jogos de azar. Ao mesmo tempo, o ministro da Justiça Carlos Luz, que estava de olho nas eleições para o governo de Minas Gerais, imaginando forte adesão do eleitorado, entrou na luta para convencer o presidente. Assim, no dia 30 de abril de 1946 o decreto-lei 9215 acabava de vez com os jogos no Brasil. E o ministro fez a aposta errada, pois não se elegeu.

O baque foi grande. Como o decreto-lei de fechamento entrou em vigor na data da sua publicação, não houve tempo para que o mercado se preparasse. Milhares de brasileiros, entre eles artistas, cozinheiros, atendentes perderam o emprego. Terminava ali uma das atividades mais efervescentes do país.

Ciro Batelli

Um dos maiores defensores da volta dos jogos no Brasil foi Ciro Batelli. Sua experiência era impressionante. Ele foi VP da poderosa organização internacional Caesars e considerado uma das maiores autoridades em cassino em todo o mundo. Tive a oportunidade de almoçar com ele várias vezes na agência de publicidade Grafite, do querido amigo Oswaldo Marquesi. Batelli conhecia a história dos jogos de azar no Brasil como a palma da mão.

Ele me contou que, no apogeu, havia no Brasil 70 cassinos. Essas casas não se restringiam aos jogos. Abrigavam toda sorte de entretenimento. Possuíam excelentes restaurantes, salões de dança e ótimos musicais. Como não era permitida a propaganda dos jogos, a saída encontrada para divulgar o pano verde era anunciar os grandes espetáculos.

E mais, quando o taxista levava um cliente, a corrida era por conta de quem recepcionava o jogador, que recebia na chegada uma ficha para começar suas apostas. Enfim, tudo para que as pessoas se sentissem atraídas e motivadas a comparecer.

Contra e a favor

Há argumentos favoráveis e contrários em abundância para a volta dos jogos de azar no Brasil. Tive uma aluna, gerente de um bingo famoso de São Paulo, que vivia entristecida ao se lembrar de frequentadores que perdiam tudo o que possuíam no jogo. Eles jamais conseguiram se recuperar.

A volta dos cassinos fará com que pessoas que se viciam, além de correrem o risco de perder todos os bens que possuem, destruirão também suas famílias e se afastarão dos amigos. Presenciei muitos casos quando os jogos foram relativamente liberados em hotéis de Serra Negra. Indivíduos que sempre foram alegres e enturmados, por causa de dívidas de jogo tiveram de se afastar daqueles que eram seus amigos queridos.

Por outro lado, há quem defenda a volta dos jogos como fonte de trabalho e de renda para a população. Dizia-me o saudoso Ciro Batelli que, pelo tamanho da população brasileira, mais de 300 mil empregos diretos e indiretos poderiam ser criados. Seria possível movimentar o turismo e fazer com que os brasileiros que hoje viajam para fazer suas apostas fora do país deixassem o dinheiro dentro da nossa economia.

E você, é contra ou a favor?

Reinaldo Polito
Colunista do UOL
Autor de 31 livros que venderam mais de 1 milhão de exemplares, dá dicas de expressão verbal para turbinar sua carreira, como "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo", "Como falar corretamente e sem inibições", "Saiba dizer não sem magoar as pessoas", e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante, e "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.